Buchecha, Koringa, Ivo Meirelles, Anderson Leonardo (Molejo) e dg3 Music mostram o quão plural a obra da banda pode ser, do jazz ao eletrônico
“Subversão” sempre foi uma palavra inerente aos Mamonas Assassinas. Mesmo carregados de ironia e bom humor, os integrantes do grupo não deixavam passar uma oportunidade de bagunçar a ordem ou provocar os conceitos musicais em sua rápida e marcante obra, referência para toda uma geração que era criança ou adolescente nos anos 90.
E agora o espírito irreverente do grupo de Guarulhos volta à tona com as releituras mais que inusitadas dos clássicos “Pelados em Santos”, “Vira-Vira” e “Robocop Gay” no EP “Very Crazy”, com produção musical da dg3 Music e lançamento pela Universal Music Brasil, que chega hoje (27) às plataformas digitais. Os artistas selecionados para dar nova vida às pérolas dos Mamonas – e suas releituras – são surpreendentes.
O cantor Buchecha, um fera no suingue carioca, se uniu ao MC Koringa e entregaram um belo jazz para “Pelados em Santos”. Sim, falamos em jazz!! A música ganhou uma versão tão envolvente quanto emocionante, uma história de amor divertida, embalada por pianos, metais, groove e coro, digna de qualquer clube de jazz pelo mundo.
Já os cantores Ivo Meirelles e Anderson Leonardo (do grupo Molejo) injetaram ainda mais bom-humor em “Vira-Vira” e a levaram para o meio da roda de samba. A “música da suruba” já começa com os astral lá em cima e vai ganhando balanço a cada estrofe, num surpreendente partido-alto, com uma interpretação irreverente e bem carioca de Anderson e Ivo. Ah se os meninos dos Mamonas estivessem aqui para ver o quão diversificada sua música se tornaria!
O novo álbum digital, cujas versões foram aprovadas – e elogiadas – pelos herdeiros e o produtor original da banda (Rick Bonadio), encerra com um remix futurista de “Robocop Gay”, na voz dos próprios Mamonas, um hino dos anos 90 carregado de humor e inclusão muito antes do tema “diversidade” se tornar assunto tão discutido e proclamado.
O EP contém duas versões do remix, uma completa (extended) e outra mais curta (edit), para fãs de todos os níveis; ambas têm produção musical, programação e remixes assinadas pela turma da dg3 Music, comandada por David Gomes.
“Nossa intenção foi fazer uma versão eletrônica para pista de dança, divertida e livre de preconceitos, mantendo o espírito alegre dos Mamonas. Como o tema da canção é bastante sensível, apresentamos o trabalho para diversas pessoas do segmento LGBTQIA+ e todos aprovaram o resultado”, conta David.
O DJ e produtor sempre foi muito fã dos Mamonas Assassinas e as músicas da banda não faltavam em seus sets. A ideia da homenagem surgiu após David ler uma matéria sobre artistas que, infelizmente, faleceram no auge do sucesso. “Isso coincidiu com os 25 anos do acidente que os vitimou e resolvemos, então, fazer esse tributo”, explica ele, referindo-se à trágica queda do avião que levou a banda, durante um voo na Serra da Cantareira, em São Paulo.
O produtor, então, se debruçou sobre as músicas e as possibilidades de uma homenagem diferente em “Very Crazy”. De um projeto anterior de releituras jazzy de músicas brasileiras, veio a ideia de “Pelados em Santos”. “Quando mostramos o arranjo jazz para Bochecha e Koringa, parceiros de outras produções aqui na dg3, eles adoraram e toparam na hora”. Já o arranjo de “Vira-Vira” foi criado em samba. “Eles ouviram e sugeriram o Ivo Meirelles, que também aceitou na hora. A cereja do bolo foi o Anderson, que adorou a ideia e, com seu jeito irreverente e brincalhão, deixou a música com o espírito dos meninos dos Mamonas”, completa David. “Queria aproveitar para agradecer ao Jorge Santana, primo do Dinho e gestor da marca dos Mamonas, pelo apoio, parceria e confiança”.
Um dos grupos mais populares e de sucesso meteórico no Brasil, os Mamonas Assassinas lançaram seu único álbum de estúdio em junho de 1995; eram amados por fãs de várias idades, de crianças a adultos, todos conquistados pelo som, humor e ironia de Dinho, Bento, Julio, Samuel e Sergio. Assim os fãs os chamavam – pelo nome –, de tão conectados que eram com suas músicas e atitudes, muito antes da existência de redes sociais. O grupo vendeu quase 2 milhões de cópias do álbum “Mamonas Assassinas” e teve a vida interrompida pelo acidente nove meses depois, em março de 1996.
Os Mamonas deixaram muita saudade e a certeza de que a música brasileira pode e deve seguir subvertendo qualquer ordem – porque a arte não precisa ter regras nem legenda, e sim bom gosto e diversão.
Foto capa: Reprodução/ Revista Exame. por Ricardo Corrêa/Arquivo Abril.
Por Kélita Myra – agosto de 2021.