COLUNA | A enfadonha transfobia artística cultural

Estamos vivendo um grande momento histórico onde pessoas trans (travestis, homens trans e não-bináries) estão chegando cada vez mais nos espaços artísticos e musicais, mas será que realmente estamos presentes de fato ou existe uma névoa que paira sob as nossas cabeças de onde recai dúvidas sobre nossa arte ser ou não ser uma arte válida? A cisgeneridade é quem detém o poder de validar nossa arte, e mesmo assim continua invalidando nossas existências plurais!

Para escrever esse texto me peguei lembrando do caso de transfobia recreativa numa live de Marília Mendonça, vocês lembram ou já se esqueceram? A problemática daquela história onde conta aos risos que um músico de sua banda ficou sexualmente com uma mulher trans tem camadas muito maiores do que arrancar risos, costumo dizer que o Brasil não é o país que mais mata LGBTQIA+ no mundo, o Brasil é o país que mais mata pessoas trans, ora, não digo que ainda não exista violência contra gays, lésbicas e bissexuais, porém a dissidência desses grupos foram se dissipando na década passada, principalmente com o auxílio da música com drags como Pabllo Vittar e Glória Groove, os casos de morte ou de violência física contra LGB são quase inexistentes, agora percebemos esses corpos em locais de poder, você também deve ter uma pessoa LGB em sua empresa que trabalha, mas com quantas pessoas trans você trabalha?

Recorte de títulos de Reportagens - Montagem colunista

Voltando a problemática da live de Marília Mendonça e porque a “transfobia recreativa cultural” está nos matando, um dos grandes pontos dos assassinatos contra pessoas trans decorrem de parceiros sexuais, lembro-me do caso de uma travesti do alto sertão sergipano que foi morta e jogada de um penhasco pelo parceiro sexual ao ser confrontado por ela sobre o fato dele não assumir publicamente um relacionamento afetivo, o amor mata pessoas trans, pois a cisgeneridade heterossexual não consegue levar corpos trans a sério, pois servimos de escárnio humorístico para eles.

Alice Marcone, ela é a única travesti que canta sertanejo em todo o território brasileiro, ela tem músicas com letras belíssimas, clipes muito bem produzidos, mas ainda não tem os números astronômicos que o sertanejo cis heterossexual carrega consigo, pedi pra ela comentasse o porquê desse inverso nada natural:

Alice Marcone - Foto Divulgação

“Pensar nas diferenças de atenção que o sertanejo universitário cis heterossexual recebe e o queernejo é pensar sobretudo na estrutura que sustenta o sertanejo tradicional. Esses números exorbitantes do sertanejo são frutos também de um investimento massivo do capital do agronegócio, das indústrias de bebidas alcoólicas e de um formato de produção uniformizado e consolidado das grandes gravadoras. Esses artistas estão lá porque tem muito dinheiro interessado em sustentar os seus discursos às vezes machistas, conservadores, lgbtfóbicos e racistas e muitas vezes “isentões”. O queernejo, por outro lado, sofre de um duplo boicote: do mercado sertanejo tradicional, que não quer ver o imaginário e as narrativas do sertanejo transformadas; e de um público mais progressista que não se interessa pelo sertanejo – especialmente pelo seu recente histórico de perpetuação de opressões – e não reconhece que o gênero possa se tornar uma expressão artística genuína e progressista. Mas isso não significa que aos poucos estamos conquistando nosso espaço”, comenta Alice Marcone que acabou de lançar um videoclipe para uma faixa em parceria com Gabeu (artista queer que também canta sertanejo), assista “Pistoleira”: 

Essa coluna será dividida em duas partes, em nosso próximo encontro iremos falar sobre o ritmo musical pelo qual faço parte, o RAP, falaremos em como a transfobia está enraizada e como podemos reverter isso, derrubamos o CIStema ou arrancamos suas raízes? 

É Isis, CARALHO!

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