COLUNA | Para maiores de quarenta anos!

Não, não estou querendo separar e não é uma restrição ou censura, mas uma espécie de inclusão.

Existe um conflito no meio artístico que é mais ou menos assim:

“Quando jovens, queremos ser maduros e quando maduros e experientes, queremos ser jovens.”

E junto com esse conflito vem algumas questões pertinentes:

Como é envelhecer como artista?

Estamos preparados para isso?

O mercado responde?

O público consome?

Como se reinventar?

Como ainda ser um produto vendável?

Por experiência própria, ando vivendo essa, digamos, angústia/motivação.

O foco na moda, nas artes e na música é quase sempre no jovem, porém, poucas vezes o jovem está maduro para o mercado. 

A solução está exatamente em quem traz a experiência aliado a uma mentalidade moderna que não se perdeu com o tempo. E sim, evoluiu com ele: Os Velhos Jovens ou os Jovens Velhos. 

Campanhas de moda com pessoas acima dos 40, eventos com pessoas 50+ no Line Up, ter no meio artístico pessoas com grande bagagem cultural é também uma forma de inovação.

Com a era digital os vovôs deram espaço aos veteranos e cada vez mais o Old School é importante e atrativo, em todos os aspectos.

Os Jovens Velhos estão em plena atividade, geralmente tem um bom poder aquisitivo e uma visão de mundo moderna, sem abrir mão da vanguarda.

Quando o mercado não abre espaço para o experiente está sendo exatamente o que preconceituosamente chamam de careta e atrasado. É possível haver equilíbrio pois existe mercado para todos. Principalmente para pessoas como eu que querem ser vistos e representados de forma ampla e inclusiva e com experiência suficiente para inovar e surpreender.

Nunca o Old School foi tão New. E quando se une os perfis, inclui-se, eleva-se a auto estima, amplia-se o público e ganha-se muito mais.

Inove! Invista na Experiência. Pois a vida recomeça aos 40.

U96 e Wolfgang Flür (Kraftwerk). Gigantes nomes da música eletrônica lançaram juntos, em 2020, o álbum Transhuman, logo após o sucesso da faixa “Zukunftsmusik”. Um bom exemplo de que a Old School não apenas está em evidência, como dando aula. 

Ellen Allien - Foto: Reprodução/DJ Tech Tools.

Ellen Allien, produtora de música eletrônica e uma das melhores DJs do mundo atualmente, possui tanto em suas produções, como em seus sets, forte influência Old School. Exemplo disso é seu álbum Alientronic que claramente lembra em sua sonoridade nomes como CJ Bolland, ícone da Old School.

Sleaford Mods. Foto: Reprodução/Rolling Stone.

Sleaford Mods, duo que atualmente é uma sensação no Underground inglês, teve participação em álbuns de dois nomes de peso na cena eletrônica Old School. Na faixa “Ibiza”, do álbum The Day is my Enemy (The Prodigy) e na faixa “Head & Shouders” no álbum Alternative Light Source (Leftfield).

Elton John e Years & Years. Foto: Reprodução/NME.
Elton John e Years & Years. Foto: Reprodução/NME.

Elton John e Years & Years fizeram uma performance memorável e emocionante durante o Brit Awards 2021, executando em piano e voz, uma versão incrível de “It´s a Sin” do Pet Shop Boys.

DEPOIMENTOS

DJ Acquavitta – São Paulo.

Foto Reprodução | Instagram

Como é envelhecer como artista? 

É perceber que a vida lhe dá escolhas maravilhosas o qual pode-se agarrar com amor e ter a mesma sensação de quando se era garoto e teve a sua 1ª vitória.

Como se reinventar? 

Pesquisar arduamente o mercado e ter gostos para poder adaptar o conteúdo a sociedade atual. 

Que som da Old School você tocaria hoje? 

Nenhum. Tento me adaptar à atualidade, mas utilizo o Old como aprendizado.

DJ Feio – São Paulo.

Foto: Reprodução/Instagram.

Como é envelhecer como artista? 

Não é algo fácil, principalmente se tratando de envelhecer no Brasil, que já não tem o costume de dar valor a figuras importantes de sua história. Porém, a experiência musical e de pista só tendem a evoluir com o passar dos anos, e isso os cabelos brancos e a aparência mais envelhecida não tem o poder de me tirar. É como um bom vinho: quanto mais velho, melhor! 

Eu sinto que as pessoas querem consumir música boa, independentemente da idade. Mas talvez isso possa ser um tabu para alguns organizadores de eventos, que podem achar que faz mais sentido contratar artistas jovens para um público jovem. Eu estou com 64 anos, com a audição perfeita e cheio de energia para ser DJ de Psychedelic Trance. 

Como se reinventar?

Para se reinventar, é essencial ter a noção de que não podemos nos dar ao luxo de parar no tempo. Independente do que já fizemos no passado, é preciso estar ligado no que está acontecendo na cena psytrance atual como um todo, desde as festas que estão rolando, labels, artistas, público e principalmente as músicas, porque elas fazem toda essa engrenagem funcionar. 

Nesse período de pandemia, estar ativo nas redes sociais se tornou ainda mais importante para manter esse vínculo forte com toda a família psytrance brasileira. Os posts, interações, lives, notícias e novos lançamentos me conectam mais intimamente com o público, e nos ajuda a matar um pouco a saudade das pistas. 

Qual som Old School você tocaria hoje? 

Nossa, tem muitos! Esses dias eu estava ouvindo um V.A. que lancei em 2008 e o achei bem atual na perspectiva musical, principalmente na parte mais técnica (levando em conta o quanto a tecnologia evoluiu daquele tempo até hoje). A lista é grande, mas vou tentar resumir: Alton, Vibra, Wrecked Machines, GMS, The Good, The Bad and Ugly, D-Tek, Alien Project, Space Cat, Lotus Omega, Man With No Name, Astral Projection, Doof, X-Dream (sempre), Total Eclipse, The Antidote, Exaile, Beat Bizzare, Atmos, S-Range, Alegria, Element, K.U.R.O, Shiva Chandra, Son Kite, Pleidians, Etnica, 12 Moons e por aí vai. 

DJ Oscar Bueno – São Paulo.

Foto: Reprodução/Instagram. @photo_sintz.

Segundo o budismo, os 4 sofrimentos que todo ser humano passa são nascimento, envelhecimento, doença e morte. Não há como escapar disso. Envelhecer faz parte da vida e o artista como todo ser humano deve entender isso. Reinventar-se deve ser um processo de busca pela felicidade. Evoluir dentro de sua arte e buscar um aprofundamento também. Ainda gosto muito de me apresentar como DJ, mas se tornou pouco pra mim. DJs que conheço começaram a produzir música e estão muito felizes. Eu estou pintando e isso está me fazendo muito bem. Estou com uma exposição marcada para junho. Tenho produzido pinturas a óleo. Espero vender tudo! 

Tocaria muita coisa da Old School. Pra mim a melhor fase da house music foi nos anos 90. Sempre toco clássicos no meu set misturados a produções atuais…

DJ Jeronimo Sodré – Salvador – BA.

Foto: Reprodução/Instagram. @maiatamires
Foto: Reprodução/Instagram. @maiatamires

São duas questões que andam juntas mas nem sempre, são questões diferentes também. A figura do artista produz a arte, independente do produto final, sendo assim, cada vez que ele envelhece ele continua criando, cada um com seus processos e maneiras, é claro, mas eu diria que esse processo criativo deveria acontecer como na simbologia do Sankofa, você precisa olhar pra trás para andar pra frente, revisitar, escavar coisas passadas para nutrir a consciência criativa. Assim nesse processo também vão aparecendo novas ideias e refrescando tudo, mas isso ainda independe do produto final. O produto final acho que até estaria coligado nesse processo criativo, lá você pode escolher o público que quer direcionar ou se vai ser algo mais independente de público, porém se vai vender ou não são outros quinhentos, vem aí junto o processo próprio de divulgar e mostrar, mas talvez seja trabalho para um bom distribuidor.

DJ Dany Andrade – João Pessoa – PB.

Foto: Reprodução/Instagram.

Quem não envelhece, morre cedo! Na minha concepção envelhecer como artista é salutar. Gosto de perceber que muitas vezes sou tida como referência e sou respeitada, inclusive pelos artistas mais velhos que eu. Envelhecer faz parte do processo da vida e temos que nos preparar pra isso. Eu me reinvento ouvindo a nova geração, consumindo não só a musicalidade como analisando as tendências e comportamentos. Isso me dá a sensação inclusive que sou mais jovem kkkk…

DJ VLAD – São Paulo.

Foto: Reprodução/Instagram.
Foto: Reprodução/Instagram.

Como é envelhecer como artista?

Normalmente não estamos preparados para quase nada em nossas vidas, mas o envelhecimento é um processo natural que tem o lado positivo e o negativo. 

Com o passar do tempo, dedicação e estudo, adquirimos experiência, segurança e propriedade para desenvolver cada vez melhor o trabalho. Porém, estamos vivendo uma fase em que a grande maioria do público consome mais a imagem do que a qualidade profissional e isso é muito preocupante, principalmente na área artística. 

Existe uma boa gama de profissionais qualificados que não priorizam só imagem, mas sim a conduta e o conhecimento, infelizmente esses profissionais acabam sendo esquecidos ou desvalorizados por não seguirem os padrões atuais. 

O Mercado responde, consome de acordo com o público e as necessidades dele. 

Existe aquele antigo ditado que diz: “O vinho quanto mais velho melhor.” 

Tem uma grande quantidade de artistas com mais idade que continuam fazendo um trabalho com excelência, cito aqui dois grandes mestres Carl Cox, David Guetta (ambos com grau de conhecimento e trabalho) dentre outros é claro, o trabalho deles é consumido, não só por pessoas da mesma faixa etária deles, como também pelo público jovem. Creio que a idade não é um empecilho, isso está muito mais ligado à parte cultural. 

Eu por exemplo, completei 27 anos de carreira, abri uma escola para formação DJs, a DJ Class, onde eu procuro passar um pouco do meu conhecimento, vivência e conduta para colaborar na expansão do cenário eletrônico. 

O importante é que tenhamos pessoas interessadas em aprender corretamente, independentemente da idade e objeto. 

Como se reinventar?

Existem várias maneiras de se reinventar, uma delas é o trabalho da imagem, mas claro que existem outras no mercado atual como a parceria que é uma forma de agregar as partes interessadas em crescimento e ser vendável para o mercado. 

Eu acho que se reinventar é uma espécie de Pack! Acredito que existam vários fatores interligados como estudo, conhecimento, acompanhamento da tecnologia, busca de sonoridades e entender o que está acontecendo (aquecendo) o mercado atual, assim você conseguirá extrair o que é cabível dentro do que precisa vender. 

Que som da Old School você tocaria hoje? 

Sou consumidor da música eletrônica desde os primórdios, se eu tivesse que escolher agora uma sonoridade para tocar na linha mais oldschool com toda certeza em primeiro lugar seria o Garage House (Underground) tinha um leque gigantesco de sonoridades… é o tipo de som que eu me identifico muito, em seguida seria o Ítalo House e o Techno.

Cláudio Manoel Duarte (aka DJ Angelis Sanctus) 

Foto Divulgação.
Foto Divulgação.

Produtor cultural no Pragatecno e Prof. Dr. na UFRB.

Como é envelhecer como artista?

O envelhecimento é um destino. Um destino para aqueles que viverem mais. Adquire-se aí um tempo mais alongado para os sufocos e os prazeres, em diferentes medidas, e de diferentes origens, inclusive de estratificação social. Envelhecer pobre e artista é diferente do envelhecer sem ser artista? E nem rico, nem pobre, nem artista? Quero dizer que há muitas conjunções que redefinem esse envelhecer. Vejam o atleta. Dele é cobrado, além de talento, eterna juventude, força e beleza. Que mercado cruel o conformou, deu brilho a esse atleta e agora o descarta? Vejam o operário da construção civil, o pedreiro cheio de experiências, típico de quem viveu mais e experimentou mais: seu corpo declina, sem força para as coisas pesadas da construção de paredes e pisos, enquanto a mente sabe cada vez mais todas as sabedorias. O corpo torna-se, aos poucos, um drama-quase-tragédia que não sustenta nem mesmo a si. O corpo envelhecendo é lindo, mas também uma agonia que vai se sustentando no que resta de si. Nem, às vezes, esse corpo motiva mais os pensamentos ricos da mente, ainda cheio de vontades. Vejam o artista. Dele usufruímos de sua capacidade de nos distrair, de (a nós) promover sensações e emoções, alegrando nossas vidas ou nos fazendo pensar com um ato triste. Em qualquer exemplo, em qualquer profissão, é o entorno que nos condena. Não dá para fugir do chavão: o capitalismo disfarçado de novo liberalismo quer lucro e tudo que declina e não produz como antes é quase um descarte. Mas ainda é feio descartar assim, abertamente. Então descarta-se devagar, como uma condenação lenta. Vejam o trapezista. Tão lindo e esvoaçante. Ficamos sofrendo, com medo de sua queda, mas felizes pela tensão, porque ele pode de fato cair e espatifar-se todo, mortinho, sangrando. Mas, espatifa-se antes, aos poucos, porque não é mais belo e jovem e nem esvoaçante, porque envelheceu. Envelhecer como artista é o mesmo que envelhecer. Mas envelhecemos, repito, diferente, a depender de nossa classe, cor, gênero… e dos mundos ao redor, que elege a sabedoria como valor ou nos condena como improdutivos. Para não deixar somente esse clima dramático, lembro de Bowie que chamou o envelhecer de um processo extraordinário em que você se torna a pessoa que você sempre deveria ter sido.

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