REVELAÇÃO | KHALINE: Uma nova representante do poder feminino no Dark Psytrance Nacional

Aline Batista é uma jovem natural da cidade de Santos-SP e que tem cativado pistas ao redor do Brasil e do mundo com sua sonoridade poderosa e psicodélica através de seu alter-ego Khaline. Por um lado, é uma moça introspectiva, de poucas palavras e olhar expressivo. Encantada pela música árabe e pela dança, ela ama a tranquilidade e usa músicas orientais para acompanhar boa parte de suas tarefas diárias. Por outro lado, busca potencializar sua comunicação e sua alegria artística através de suas influências cheias de peso, vitalidade, obscuridade e batidas rápidas e hipnóticas. Ela nos apresenta um som denso e cheio de camadas, regado de referências com músicas árabe e dentro do rock’n roll, especialmente as vertentes hardcore e punk-rock e na música eletrônica traz como inspiração nomes como Marambá, Psykovsky , Insane Creatures, Necropsycho , Noise Gust.

A nossa nova e brilhante estrela nasceu na constelação de touro e já estreou em grande estilo neste ano de 2024. Apresentou-se em festas e festivais que representam sonhos não alcançados por muita gente mais experiente e nos conta como o trabalho duro e a paciência de alimentar e completar a gestação do seu projeto foi determinante neste grande e fabuloso início de carreira. Confiram:

Você sempre pareceu bem misteriosa e de poucas palavras, características comuns em pessoas que se expressam visceralmente através da arte. Quando surgiu essa vontade para produzir psytrance?

Eu conheci o psytrance há quase 20 anos, quando ainda morava no Espírito Santo, e logo de cara me encontrei dentro deste universo. Sempre que possível estava nas festas e festivais, e era onde eu me sentia bem. No quesito artístico, sempre fui encantada pela dança e pela música, e desde quando eu era apenas parte do público, eu vislumbrava poder me expressar neste movimento, não só através da dança na pista, mas também através da música que vai guiar a dança, trazendo minhas ideias e referências que eu gostaria de ouvir dentro do psytrance. Pouco mais de 10 anos atrás eu estava conversando com a DJ Kali, e disse a ela que gostaria de tocar também, que gostaria de produzir minha própria música. Então ela me convidou para fazermos uma prática na casa dela com CDJ, pra eu ver como era mixar, e que talvez eu pudesse gostar também. Ela foi super aberta comigo e me deixou livre pra levar meus pendrives com minhas referências. Eu sempre curti sons mais obscuros e com velocidade mais alta, era raro ver essa categoria de som nas festas, e era isso que eu gostaria de levar para a pista. No dia eu levei como referência aqueles Psycore bem extremos, no mínimo uns 210 bpm, e foi bem engraçada a experiência. Não rendeu muito aprendizado nos decks, mas o apoio e estímulo de uma amiga tão talentosa foi muito importante pra mim e também a diversão foi garantida. Mais tarde, em 2016 eu, a Jana Sarzi e o Vinicius Oliveira (galera do renomado Pulsar Festival) estivemos no estúdio do DJ e produtor Franco Auriemma, que nos deu um panorama muito bacana do processo criativo da produção. Naquele momento tive mais clareza do que é ser uma produtora, e percebi que era um estudo bem complexo, que me exigiria dedicação e um maior preparo financeiro para custear as aulas e adquirir os equipamentos básicos, não sendo possível para mim iniciar minha jornada naquele momento. Até que em 2016 conheci o meu marido, João (Marambá), e desde as nossas primeiras conversas, manifestei o interesse de produzir. No ano seguinte voltei a morar em São Paulo e a partir daí ele virou meu professor e mentor.

Xibalba Festival - Rio Grande do Sul (2024).

Acompanhei a sua estreia oficial através das redes sociais a estreia oficial da Khaline na HTR 7 e foi uma apresentação muito autêntica e impactante, surpreendendo muita gente no contexto de um line up recheado de monstros do psytrance. Você se apresentou em festas menores e reuniões de amigos antes para ganhar confiança ou foi “diretão” assim mesmo? Conta pra gente qual o sentimento, como foi essa experiência?

Minha primeira apresentação foi direto na Hitech Revolution, e foi absolutamente surreal, transcendental! Eu sabia da responsabilidade e experimentei todas as preocupações e ansiedades que a ocasião permitia: medo de errar, preocupação com o julgamento, minha timidez, e por aí vai. Fazer parte de um line up tão cabuloso e sabendo a importância nacional e internacional que a HTR tem por sua representatividade, foi um mix de emoções que me fez vibrar de uma forma única! Eu tremia, sentindo toda a adrenalina da primeira vez fazendo algo novo, e que era tão esperado por mim. Mas me entreguei completamente e sinto que vivi a experiência mais realizadora da minha vida até o momento. Eu tinha experiência de palco apenas como bailarina de danças orientais, e estar ali, fazendo um novo ofício, foi um renascimento do meu lado artístico. Eu transcendi minha introspecção e pude, enfim, compartilhar em primeira mão a arte que eu vinha produzindo, quase que secretamente, nos últimos anos. Foi uma experiência que me revitalizou, e vou me dedicar para continuar fazendo isso.

 

 
 
 
 
 
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Você atualmente trabalha exclusivamente produção de música eletrônica ou tem outra profissão? E como foi o caminho profissional até antes da estreia do projeto musical?

A maior parte do meu tempo de trabalho foi como bartender, mas até chegar nesse cargo fiz muitas outras coisas, já fui vendedora, garçonete, entreguei panfletos na rua, fui técnica de urnas eletrônicas e dei aulas de dança. Atualmente meu tempo se divide entre a produção de música e os afazeres domésticos da minha casa.

Como foi o apoio familiar e dos amigos para que você perseguisse esse sonho? 

Eu não sou de falar muito, nem com muitas pessoas. Minha família sempre me apoia no que eu queira fazer e torcem pelo meu sucesso. Aos poucos amigos que cheguei a compartilhar que estava trabalhando no meu projeto, recebi incentivo genuíno. Sinto que desde o início, compartilhei este sonho com as pessoas certas, e elas foram fundamentais para que eu acreditasse em mim mesma e não desistisse.

Quais são os hábitos que você considera que fortalecem sua criatividade e concentração para produzir sua música?

Eu vejo muitos filmes e com certeza esse hábito fortalece minha criatividade. Porém, para além de estímulos externos, o que mais influencia minhas produções é meu próprio interior. Minhas questões pessoais, vivências, lembranças e sentimentos. Quando estou bem ou quando estou mal, é um prato cheio para traduzir em música, e consequentemente essas criações levam a carga emocional da história contada. Para minha concentração, preciso de um ambiente organizado e silencioso, e se possível não deixar assuntos importantes pendentes. Gosto das coisas resolvidas, na medida do possível, caso contrário não consigo pensar em outra coisa nem adentrar no universo inteiro que uma track é para mim.

Syncronia - GO (2024).

Diante do seu jeito mais introspectivo, como é sua visão sobre o alcance das mídias digitais no contexto do seu som?

Ao meu ver, independente do tipo de som, se fazer presente nas mídias digitais é fundamental. Porém, justamente pela minha personalidade mais fechada, essa é minha maior dificuldade e atualmente é o que mais precisa ser trabalhado no meu projeto. Especialmente falando de mídias sociais, creio que ela seja a maior ferramenta de divulgação de um artista hoje em dia, não só para divulgar suas músicas, mas também para compartilhar mais sobre a pessoa e a personalidade que existe por trás daquele projeto, criando um vínculo de conexão mais sólido. Cada artista vai trabalhar isto à sua maneira, divulgando fotos e vídeos de suas apresentações e do seu estilo de vida, além de disponibilizar suas músicas em todas as principais plataformas de música. Para mim é bem mais fácil a parte de divulgação da música em si, mas as mídias em que eu apareço, como fotos e vídeos das apresentações, ainda tenho um certo bloqueio em compartilhar. Mas estou trabalhando nisso internamente, respeitando meu processo e tentando curtir e me sentir confortável em cada nova exposição da minha figura (risos).

Temos uma cena nacional bem rica e Khaline veio com tudo! Tem alguma collab em vista que você possa nos revelar?

Com certeza! Eu gosto bastante de fazer collabs, sinto que aumenta o meu repertório de aprendizado. Há pouco fiz o lançamento da minha primeira colaboração com o projeto Vutt’un, e há mais por vir com Marambá, Telluza, Innah e mais alguns artistas que poderei falar em breve.

Eu tinha programado te perguntar sobre sonhos a serem realizados, mas vejo que você já está trilhando este caminho! Conta pra nós um pouco das suas apresentações após a HTR e como essas sensações adrenalizantes estão se desenvolvendo!

Só tenho a agradecer! Desde então, já toquei em algumas festas conceituadas e com um público bem experiente e receptivo. Festas lindas, que já apreciava como público, e não imaginava fazer parte como artista tão cedo. Por exemplo, a Xibalba Festival no RS, a Syncronia em GO, e a mais recente foi o Masters of Puppets na República Checa. Eu fui apenas para acompanhar o João, que iria se apresentar no festival, mas fui preparada com meu backup na bolsa, afinal, vai que alguém não comparece? Na noite do dia 3 chegamos ao festival, estávamos curtindo na pista, e eu mentalizei: “um dia eu vou tocar neste Rage Stage”. No dia 4 acordei com uma ligação me convidando para tocar, pois havia faltado uma pessoa. E inesperadamente, lá estava eu estreando meu live fora do Brasil. Essas experiências estão sendo engrandecedoras e muito recompensadoras. Sobre as próximas GIGs, posso comentar aqui as que já estão anunciadas, que é o Circuito Dark e Hitech em novembro, e também já estou confirmada no festival Hitech Revolution em de janeiro de 2025. Quanto às sensações, são as mais diversas: felicidade, insegurança, respeito, determinação, plenitude. Todas elas convergem na hora da apresentação, e trazem essa sensação única que é compartilhar uma parte de mim, sem precisar falar nada, apenas através da dança coletiva.

Deixa eu tocar num assunto um pouco delicado? Sabemos que o público ainda apresenta um pouco de misoginia pelo fato de você ser mulher e estar casada com um produtor já renomado, mesmo que seu som apresenta forte personalidade e seja bem diferente da linha que o João toca. Houve comentários negativos ou inadequados a esse respeito? Se sim, como você está reagindo?

O meu projeto é idealizado e planejado por mim há muitos anos, e o João esteve comigo desde o início, me ensinando e me guiando pelo melhor caminho, com toda sua experiência. Além de meu companheiro de vida, ele é um grande mestre pra mim e eu tento absorver o máximo de conhecimento que ele pode me oferecer. Mas nosso estilo de som é diferente, temos referências diferentes e passamos mensagens diferentes. E felizmente, talvez esse seja um dos feedbacks mais frequentes que eu recebo. Isso é um bom sinal, quem se propôs a ouvir, conseguiu entender a mensagem e sentir a personalidade de cada um através da música. Mas sim, como era de se esperar, já recebi comentários de cunho misógino. Antes do lançamento do meu projeto já havíamos conversado sobre isso, que com certeza aconteceria, portanto, não foi nenhuma surpresa. Eu lido com isso apenas não lidando. Eu sou uma mulher dedicada e comprometida com o que me propus a fazer. Estou muito feliz em estar fazendo este trabalho, muitas pessoas se conectam de forma verdadeira com ele. Isso é muito gratificante!

 

 
 
 
 
 
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Além do João, tem outras pessoas que você gostaria de enaltecer pelo apoio emocional e técnico para tornar viável a realização da sua carreira?

Sinceramente, toda a elaboração do meu projeto foi algo bem particular. Mas eu gostaria de agradecer as primeiras crews que me abriram as portas para apresentar meu trabalho para o público, Cosmic Crew, Xibalba e Syncronia. Ter o apoio de festas tão especiais logo no início da minha jornada foi crucial.

Temos muitos leitores que ainda não ouviram seu som. Como você poderia dar uma breve descrição em palavras da sua sonoridade e o que deseja causar na platéia nas apresentações da Khaline?

Eu gosto de sons mais densos e com BPMs elevados. A obscuridade desse estilo de som representa uma paisagem sonora introspectiva, um mergulho dentro de si para sentir e processar coisas que ninguém, além de si mesmo, tem acesso. É um convite a meditação ativa, através da dança. Apesar da pista de dança ser uma experiência coletiva, a interpretação e a forma de sentir o som vai ser individual. E mesmo que o ouvinte acesse suas emoções mais desconfortáveis neste processo, tento trazer algo de belo ou emocional, para que no fim, seja um processo pessoal satisfatório.

Certamente, Khaline é um exemplo de expressão original e que vem surpreendendo as pistas por onde passa. Temos uma boa parcela do público da Colors DJ Magazine que também vem trabalhando na produção ou na mixagem como DJ e que deseja estar comandando pistas num futuro próximo. O que você recomenda para nossos leitores que têm essas aspirações?

Posso recomendar coisas que funcionaram pra mim: seja paciente, não tenha pressa em lançar seu projeto se você não trabalhou na evolução dele o suficiente. Se aperfeiçoe e peça opiniões sinceras de alguém que entenda do assunto. Seja autêntico, você pode se inspirar em outros artistas, mas não queira ser igual a ele. Use suas próprias referências, se inspire em estilos de som que também façam parte da sua personalidade. Se programe e tenha um planejamento detalhado dos seus próximos passos (lançamentos, identidade visual do seu projeto, divulgações, etc).

Repórter: Rodrigo Sobrinho

Editores de texto: Orly Fernandes e Dih Aganetti

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