REVELAÇÃO | “Girl Bush”

É com imenso prazer que trazemos mais uma DJ Revelação nesta edição, uma artista única, que vem ganhando espaço e arrebatando admiradores na cena psytrance, pelo seu som totalmente atípico e envolvente. Estamos falando da embaixadora do Bush prog no Brasil, estamos falando de Kali Yuga!

Kali Yuga é o nome que veste a artista e jornalista Daniele Sisnandes, de 35 anos, residente de Balneário Camboriú, Santa Catarina. Vindo de uma construção musical iniciada ainda na barriga da mãe por influência do pai, que era músico, não demorou para que Kali se apaixonasse pelo meio. As aulas de violão e canto na adolescência fizeram com que essa artista começasse a se descobrir e a expandir seu interesse pela música, onde inicialmente deu seus primeiros passos como vocalista de uma banda de hardcore, e passando posteriormente para a música eletrônica, onde se manteve até aqui. 

“Não basta ser talentoso, olha o tanto de artista incrível e praticamente anônimo que existe no mundo… a gente precisa fazer o dever de casa.”

Dona de uma história incrível de persistência e superação, Kali vem se consolidando de forma positiva e consistente na cena psy, principalmente pela sua autenticidade e psicodelia encontrada nos seus sets e apresentações.

“Se eu conseguir fazer outras pessoas, principalmente outras mulheres, acreditarem no seu sonho, acho que vou ter cumprido meu propósito, e pra mim isso é sucesso.”

Nos conta um pouco sobre o seu estilo musical na cena Psy, o Bush prog.

Eu toco bush prog, que é um progressivo com raízes na Austrália, parecido com prog dark, com uma vibe mais pantanosa e não tão pesada. Ainda é um pouco novo por aqui, mas desde que eu adotei essa vertente, meus sets têm tido uma grande receptividade. Acho que isso acontece porque o bush prog tem forte influência de elementos orgânicos, é bem percussivo, hipnótico e tribal, é o que o diferencia do prog dark e o torna mais acessível a públicos diversos, na minha opinião. Atualmente faço parte do casting da Ilumini Bookings, e sou label DJ da Universal Tribe Records (Austrália).

A quais conquistas você atribui o engajamento da sua carreira?

Muita dedicação ao trabalho, profissionalismo e networking. No começo da pandemia pude parar e realinhar meu projeto, até chegar ao bush prog. Como sou comunicadora, quis deixar bem clara essa mudança, na música, no meu posicionamento e no branding pessoal. O artista precisa pensar em si como uma marca, criar planejamento, se organizar. Não basta ser talentoso, olha o tanto de artista incrível e praticamente anônimo que existe no mundo… a gente precisa fazer o dever de casa. Foi assim que eu atraí atenção da minha label preferida de bush prog, do outro lado do mundo, e fui convidada a ser a única DJ representante deles no Brasil.

“Me propus a levantar a bandeira do bush prog por aqui como se fosse embaixadora dessa vertente.”

Como surgiu a paixão pelo PSYTRANCE, e porque a escolha desta vertente?

Eu me apaixonei pelo psytrance no começo dos anos 2000. Comecei tocando full on morning, em 2005. No ano seguinte eu sofri um acidente de trânsito grave voltando de uma gig. Aquilo mexeu bastante com a minha vida, tive que passar por cirurgias no rosto e sofria com dor crônica no corpo. Fui desanimando da carreira e saí para me dedicar ao jornalismo, tanto que me afastei da cena por quase 10 anos. Mas eu sentia muita falta, da música e desse espírito único de respeito que só o psytrance e suas festas têm. Quando voltei a tocar, em 2018, fui conquistada pelas vertentes mais underground e noturnas do progressivo. Aí veio a pandemia, eu comecei uma pesquisa intensa por novas sonoridades e o progressivo australiano conquistou meu coração. É um som carregado de ancestralidade, cria conexões com lembranças que a gente nem sabia que tinha. É difícil de explicar, mas você consegue sentir. Me propus a levantar a bandeira do bush prog por aqui como se fosse embaixadora dessa vertente. Eu não queria só tocá-la, me propus a falar e produzir conteúdo sobre ela, e tem sido incrível ver como esse som conecta e desperta curiosidade. 

Sabemos que são muitos os obstáculos enfrentados no mundo artístico, relata pra gente quais foram seus maiores desafios enfrentados ao longo desses anos de carreira, e como lidar com a dificuldade de ser DJ em um ano de pandemia?

O começo da carreira foi o mais desafiador, porque eu era novinha, totalmente independente e inexperiente. Tinha que me bookar em um mercado fechado e dominado por homens, rs. Tudo aconteceu muito rápido. De um dia para o outro eu estava com a agenda cheia, mas não sabia lidar com aquilo. Não tinha orientação sobre gerenciamento de carreira, nada. Lembro de uma gig que eu cheguei atrás do palco antes de tocar e só queria chorar, com saudade de casa, cansada da estrada. Eu era nova e não tinha a compreensão de tudo que uma carreira traz. Não foi fácil, mas eu agradeço todas as oportunidades e aprendizados. Agora, nesta minha segunda fase, vamos dizer assim, eu já vim mais madura, psicologicamente mais forte e sabia o que queria. Eu abracei uma linha de som onde há pouquíssimas mulheres e mesmo assim me sinto um pouco mais bem-vinda. Acho que é resultado do meu posicionamento. Na pandemia, em vez de me isolar em alguma panela, eu aceitei todo convite para live, fiz questão de me aproximar, prestigiar o trabalho de quem tá na mesma linha. Eu defendo que o underground precisa se fortalecer através das conexões e se eu puder fazer isso, o universo vai me dar de volta, ou no mínimo eu fiz alguns bons amigos pela rede social!

“Gratidão por ser minha própria prova viva que, se a gente faz com o coração, está sempre em tempo de sonhar e tirar um projeto da gaveta.”

Qual o sentimento de ver o seu projeto ganhando maior visibilidade, e a receptividade do público?

Eu costumo usar uma expressão nos meus posts que é “gratidão sem limites”, é assim que eu me sinto. Gratidão pela segunda chance que eu tive para que criasse conexões e motivasse emoções através da música eletrônica. Gratidão por ser minha própria prova viva que, se a gente faz com o coração, está sempre em tempo de sonhar e tirar um projeto da gaveta.

Nos fale um pouco sobre a perspectiva feminina dentro do psytrance. Como você se vê como mulher e DJ neste meio?

Legal você perguntar isso. Nós mulheres precisamos nos sentir representadas em todas as esferas. Quando vemos outra mulher em um lugar de destaque, como o palco, por exemplo, aquilo se torna uma inspiração. É como uma semente. Quando eu comecei a frequentar raves no começo dos anos 2000 havia pouquíssimas DJanes no hibpm, mas eu lembro como o trabalho delas me motivou a sonhar e hoje estou aqui. Se eu conseguir fazer outras pessoas, principalmente outras mulheres, acreditarem no seu sonho, acho que vou ter cumprido meu propósito, e pra mim isso é sucesso.

Com o avanço da vacinação quais planos e expectativas para a volta dos eventos? 

A expectativa está gigante, o coração tá explodindo, muita saudade de sentir a emoção de abraçar os amigos e tocar de novo. Eu acabei de tomar a segunda dose e agora me sinto um pouco mais segura de voltar a essa rotina, mas ainda com cuidado, sem pressa. Meu retorno oficial é no começo de outubro, no Encontro Fora do Tempo, um evento com capacidade limitada, em Governador Celso Ramos/SC. Mas acredito que o ritmo das coisas voltará ao normal no ano que vem. Já tenho dois festivais em outro estado marcados para o primeiro trimestre e estou bem ansiosa por outras conexões que vão surgir até lá.

Nos conte um pouco sobre as novidades que o Projeto traz para este ano ainda.

Estou completando um ano de Universal Tribe Records, o que é um marco muito especial para mim e estou preparando um set especial. Vai ser uma fusão entre o bush prog da UTR e o prog dark de amigos produtores brasileiros, que eu gosto muito… conexões que fui fazendo ao longo da pandemia. Vai ser o meu jeito de homenagear o underground brasileiro. Fora isso, quero aproveitar esse último momento de tranquilidade do ano para focar nos estudos de produção musical. 

Deixo meus votos de saúde a todos, cuidem-se, curtam esse retorno com responsabilidade. E gratidão a Colors DJ pelo espaço para contar a minha história. Nos vemos em breve na pista! Com carinho, Dani.

Foto de capa: Elis Jacques Rootts.

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