Com uma trajetória de superação e reinvenção, a DJ Din Fênix se consagra como uma das novas estrelas da música eletrônica, levando a sua arte para os palcos do Brasil e do mundo, sempre com um olhar inclusivo e plural
A história de Din Fênix é um exemplo de como a paixão pela arte e a coragem de se reinventar podem levar a pessoa a lugares inesperados. Din Fênix cresceu imersa na pluralidade da música brasileira, mas foi na música eletrônica que encontrou sua verdadeira vocação. A trajetória do artista é marcada por desafios, conquistas e uma constante busca pela transformação, que o levou a transitar por diferentes fases artísticas, até chegar à cena eletrônica. Hoje, com o título de DJ REVELAÇÃO, Din se destaca não só pelo seu talento, mas também por ser uma representatividade da comunidade LGBTQIAPN+, unindo seu amor pela arte drag à mixagem das pistas de dança. Sua carreira em ascensão é um reflexo de perseverança e da força de suas origens, e é exatamente isso que o faz ser uma das novas vozes de destaque da música eletrônica.
Din Fênix não é apenas um DJ, é uma expressão da diversidade e da resistência que a cena musical LGBTQIAPN+ tanto valoriza. Nascido e criado no Rio de Janeiro, ele foi influenciado pela música brasileira e pelas festas que marcaram a cultura eletrônica na Lapa. Como drag queen, Din soube unir o glamour das performances com a euforia das pistas de dança, transitando de dançarino e figurinista para se tornar um DJ talentoso, conhecido por sua habilidade de mesclar diferentes estilos musicais e trazer uma energia única para suas apresentações. O Brasil, mas especialmente o Sul do país, já experimenta o impacto de sua presença nas baladas e festivais, enquanto Din também faz sucesso em palcos internacionais, levando sua arte e representatividade para além das fronteiras.
Na entrevista que você está prestes a ler, Din Fênix abre o jogo sobre sua trajetória artística, desde as raízes nordestinas e o primeiro contato com a música eletrônica na Lapa, até o seu amadurecimento na arte drag e a surpreendente transição para o DJing durante a pandemia de 2020. Ele compartilha os momentos decisivos de sua carreira, como sua estreia como DJ e a parceria com a Lainer Company, além de discutir sua visão sobre o futuro da cena eletrônica e a importância de dar espaço para novos talentos. Se você é fã da cultura eletrônica ou da arte drag, não pode perder essa conversa íntima e inspiradora com um dos nomes mais promissores da música eletrônica LGBTQIAPN+.
Como as raízes nordestinas da sua família e sua infância em Duque de Caxias influenciaram sua relação com a música e os valores que você carrega até hoje?
Minhas raízes nordestinas sempre foram uma fonte rica de inspiração. Desde pequeno, acordava ao som de forró e MPB. Meu pai era fã de Luiz Gonzaga, Trio Nordestino e Joãozinho de Exu, enquanto minha mãe adorava Nana Caymmi, Clara Nunes, Djavan e Milton Nascimento. Apesar de ser carioca, cresci com uma diversidade musical muito grande, que ia de ritmos populares à música do “Show da Xuxa” (risos). Aprendi que a simplicidade e a humildade, presentes tanto nas letras dessas músicas quanto no exemplo dos meus pais, podem nos levar a lugares inimagináveis. Minha mãe, em especial, foi uma grande inspiração. Ela tinha uma força incrível e sempre dizia: “Problemas eu já tenho demais, eu quero é solução!” Essa leveza e otimismo marcaram profundamente minha infância e moldaram a forma como encaro a vida e a música.
Como foi seu primeiro contato com a música eletrônica e com a diversidade da cena LGBTQIAPN+? De que forma isso moldou sua trajetória artística?
Meu primeiro contato com a música eletrônica foi aos 13 ou 14 anos, na Lapa, no Rio de Janeiro. Minha mãe tinha uma barraquinha em frente à Fundição Progresso, onde acontecia a festa Vandemente, que reunia ritmos como house, tribal house e trance. Eu ficava do lado de fora, ouvindo aquelas batidas incríveis e observando as pessoas saírem felizes e cheias de energia, comentando: “Que delícia foi essa noite!”. Isso despertou minha curiosidade e me marcou profundamente. A diversidade cultural e a pluralidade de tribos que conviviam nesse ambiente me mostraram o quanto a música eletrônica podia ser rica e inclusiva. Quando finalmente entrei em uma dessas festas, percebi que tudo o que eu ouvia do lado de fora era verdade: a música eletrônica é um universo de emoções intensas e uma conexão com a arte e a diversidade que se tornaram parte essencial de quem sou.
Você teve o privilégio de conhecer grandes artistas e figuras da cena, como o DJ Felipe Venâncio, a atriz Vera Fischer e a Drag Queen RuPaul. Como esses encontros moldaram sua visão sobre o que seria possível na sua trajetória artística?
Naquela época, eu não tinha ideia de como aqueles encontros impactariam minha trajetória no futuro. Mesmo vindo de uma origem humilde, toda a exuberância e o glamour que eu via me fascinavam. Eu me perguntava internamente: “- Será que um dia vou poder estar ali e fazer parte disso?” Hoje, vejo que toda aquela beleza e exagero me acompanharam até que eu me percebesse como uma verdadeira Drag Queen.
Você começou a trabalhar com adereços e costura nas escolas de samba, mas também teve contato com instrumentos musicais e dança. Como essas experiências ajudaram a formar seu olhar para a arte?
O carnaval é o maior espetáculo da Terra. É áudio e visual, a arte mais democrática que existe, onde se unem todas as classes sociais, etnias e crenças. Esse universo grandioso me fez ter um olhar mais exigente sobre mim. Quando tive a oportunidade de aprender sobre instrumentos musicais e dança, me joguei de cabeça. Sabia que tudo isso agregaria ao meu trabalho, me tornando um artista mais completo.
Quando você começou a dançar e a trabalhar com a arte drag, qual foi a reação das pessoas ao seu redor e como você percebeu a relação entre a drag e a música na sua vida?
Inicialmente, meus amigos me deram muito apoio, acharam o máximo! Mas, infelizmente, também perdi muitos “crushes”, pois muitos não entendiam o que era a arte drag e a confundiam com transexualidade nos anos 2000. Hoje, as coisas estão muito mais claras e a nova geração não passa por isso. As performances das drags eram regadas a muito tribal house, com vocais de Vernessa Mitchell, Jennifer Holliday, Madonna, entre outras. A dublagem e a performance eram puro glamour.
Você venceu seu primeiro concurso de Drag em 2000. O que esse momento representou para você e como ele influenciou sua decisão de seguir esse caminho artístico?
Esse momento foi o start, a resposta que faltava para me jogar de cabeça nesse mundo. A partir daí, percebi que poderia construir uma trajetória através da arte drag.
Você fez parte de várias produções e shows, ganhando notoriedade no cenário LGBTQIAPN+ do Rio de Janeiro. Qual foi o ponto de virada em que você sentiu que sua arte estava realmente se destacando?
Foi quando ganhei o concurso de Top Drag 1140, uma das maiores casas do Rio de Janeiro e uma das mais conhecidas do Brasil. Não existia turista gay que fosse ao RJ e não conhecesse a boate 1140.
Em 2004, você resolveu dar um tempo dos palcos e se dedicou ao grupo folclórico Junino Shock do Painho. O que te fez se afastar temporariamente da arte drag e como essa pausa foi importante na sua trajetória?
Essa pausa aconteceu porque eu não conseguia conciliar os estudos, o trabalho e minha arte. Então, optei por fazer parte do grupo folclórico, que só acontecia durante as férias da faculdade. Foi uma pausa revigorante (risos).
O que te levou a mudar-se definitivamente para Florianópolis em 2010? E como a cidade foi fundamental para o desenvolvimento da sua carreira como carnavalesco e artista?
Recebi uma proposta de trabalho de uma escola de samba e, durante as férias, me encantei pela cidade, pela qualidade de vida, pelas belezas naturais e, acima de tudo, pela segurança pública. Decidi me mudar para cá e, como carnavalesco da tradicional Escola de Samba Embaixada Copa Lord, percebi que Florianópolis carecia de profissionais especializados em adereços, fantasias e costuras. Isso abriu muitas portas para mim, não só em Florianópolis, mas em várias cidades catarinenses e outros estados do Sul.
Você teve muito sucesso como carnavalesco, com 2 campeonatos e 5 vice-campeonatos. Como a experiência com o carnaval influenciou sua visão artística e sua capacidade de se conectar com grandes festas e produtores de eventos?
Após ganhar meu primeiro campeonato de carnaval, me tornei bastante conhecido na cidade (apelidado de Léo Zeus). Logo, alguns produtores começaram a me procurar para trocar ideias e explorar possibilidades de fazer parte da parte artística de grandes eventos. Minha primeira festa como diretor artístico foi a “The Box” em Balneário Camboriú (SC), organizada pelos meus amigos Jonathan e Rodrigão. Esse momento foi um divisor de águas e me levou a ser notado por muitos produtores de eventos, incluindo Bárbara Bombom, dona da boate Avalon em Goiânia (GO). A partir daí, as coisas aconteceram muito rápido. Assumi a direção artística de festas como Ejoy (SC), Barbie (PR e GO), Be One (SC), Liberty (POA), Toy (SC), Verdant (PR) e, atualmente, sou responsável por toda a parte artística do Bar do Deca, uma referência em música eletrônica na cena LGBTQIAPN+, não só no Brasil, mas também internacionalmente.
Como a transição de carreira da enfermagem para a arte se conectou com o impacto da pandemia em sua vida e no início de sua jornada como DJ?
Minha transição aconteceu pouco antes da pandemia. Depois de anos como chefe de um posto de saúde, percebi que minha rotina estava me impedindo de aceitar oportunidades artísticas que surgiam. Quando avaliei a situação financeira e vi que poderia viver da minha arte, pedi exoneração para me dedicar completamente à nova carreira. Mas, logo após a decisão, o mundo parou devido ao lockdown. As baladas fecharam, e o tempo ocioso acabou me levando a mergulhar no universo da discotecagem. Amigos próximos se reuniam em casa, e um deles trazia uma CDJ. Observando a mixagem de perto, comecei a me encantar ainda mais por esse universo e decidi aprender. Fiz um curso para dominar a técnica e iniciar minha carreira com confiança. Foi um período de desafios, mas também de descobertas que moldaram o DJ que sou hoje.
Qual foi a sensação de se apresentar pela primeira vez como DJ em 2020? E como foi a resposta do público a essa nova fase sua como Din Fênix?
Minha primeira apresentação como DJ Drag foi completamente despretensiosa. Eu só queria fazer uma surpresa para os meus amigos, que sabiam que eu estava aprendendo a tocar, mas não imaginavam que eu poderia reviver minha arte drag, agora como DJ. Já fazia muitos anos que eu não me montava, então foi um verdadeiro choque para muitos deles. Para mim, foi uma das melhores sensações que já vivi, pois pude unir o show drag com a música e com a energia que eu passava para a pista. Quando terminei, os feedbacks foram muito melhores do que eu imaginava, e mesmo ainda um pouco insegura, a apresentação foi sem erros e muito vibrante. Foi inesquecível.
Quando você entrou para a agência Lainer Company, foi uma virada importante na sua carreira. Como essa parceria abriu portas para novos horizontes e trouxe visibilidade para o seu trabalho?
Na verdade, eu já fazia parte da agência desde sua fundação, mas como figurinista. Juntos, elaboramos figurinos para DJs e dançarinos. Quando fiz minha primeira apresentação como DJ, o JP se encantou pelo meu trabalho e disse que eu faria parte do casting de novos talentos da agência. Mesmo me sentindo insegura e não preparada para tanto, fui atrás de conhecimentos e conselhos com amigos. Só em dezembro de 2020 me senti preparada e fui lançada oficialmente como a primeira DJ Drag da agência. Essa parceria me abriu muitas portas fora do estado, pois em Santa Catarina eu já era bastante conhecida pelos produtores. Muitos abriram as portas para que eu mostrasse meu trabalho. O gerenciamento de carreira e a visão de JP e Lucilo foram essenciais para que eu me adaptasse a essa nova realidade. Sem a agência, tudo teria sido muito mais difícil.
Você se apresentou em grandes clubes e festas em todo o Brasil e até no exterior. Qual foi o momento em que você sentiu que finalmente estava atingindo o reconhecimento que merecia na cena eletrônica?
Na realidade, eu ainda não tenho essa noção! Acredito que as coisas acontecem no seu tempo e nunca tive pressa. Sei que há muitos DJs super talentosos com muitos anos de carreira que chegaram antes de mim. Então, a cada conquista, a cada festa em que posso tocar e dividir o palco com esses grandes nomes, sinto que estou sendo reconhecida e isso me dá um grande gás para continuar meu trabalho.
Você tem uma grande inspiração em DJs e produtores como Sagi Kariv, Mor Avrahami e Peter Rauhofer. Como você se inspira neles no seu processo criativo e na maneira como conduz suas apresentações
A cena de hoje mudou bastante, e com ela, a sonoridade. Mas eu sou de uma época em que pude vivenciar a energia da pista de dança, que estava cheia de melodias e elementos bem marcantes nas batidas. Hoje, tento unir essas referências melódicas com a agitação, euforia e dinamismo que a cena pede, mas sempre com aquele jeitinho latino-brasileiro de ser.
Além de sua carreira como DJ, você também trabalha na direção artística do Bar do Deca. Como essa função permite que você combine seu conhecimento da cena com a oportunidade de dar visibilidade a novos talentos?
A minha carreira como DJ me leva a vários estados e grandes festas pelo Brasil, o que me permite conhecer muitos talentos fora e dentro da minha região. Procuro, ao máximo, dar oportunidade a esses novos talentos, assim como eu também tive a chance lá atrás. Sei o quanto é difícil conseguir um espaço na cena, então acredito que todas as baladas e festas deveriam abrir espaço para essas pessoas que estão começando ou que ainda estão escondidas. Só saberemos se vai dar certo se derem a chance.
Hoje, você está conquistando cada vez mais espaço na cena eletrônica, com projeção internacional em lugares como Lisboa e Espanha. Quais são seus maiores objetivos para o futuro da sua carreira e o que você espera para a próxima fase da sua trajetória?
Meu maior objetivo é chegar a grandes festivais e expandir minha carreira internacionalmente. Já estou trabalhando nisso, e se Deus me permitir, vou chegar lá em breve.
Como você espera que sua trajetória inspire novos artistas e o que deseja deixar como legado para a cena eletrônica e a comunidade LGBTQIAPN+?
Espero que minha jornada mostre a todos que nunca é tarde para recomeçar e lutar pelos seus sonhos. Aos 42 anos, estou vivendo minha arte com intensidade e paixão, algo que comecei a desenvolver aos 18, mas que só agora floresceu completamente, como uma verdadeira FÊNIX. Quero deixar um legado de resiliência, cumplicidade e parceria, lembrando que ninguém conquista nada sozinho. Para os novos artistas, meu conselho é: acredite no seu potencial, seja paciente e nunca perca a fé nos seus objetivos. As dificuldades fazem parte do caminho, mas são elas que moldam o sucesso. Quero que a próxima geração veja em minha história um exemplo de que, com coragem e humildade, tudo é possível.