REVELAÇÃO | “Alô, alô Colors DJ”

Amor pela música, talento e carisma são alguns dos atributos da nossa entrevistada de hoje, a DJ/artista e produtora de conteúdo Grazi Flores. Grazi vem fazendo um trabalho singular através de seus projetos onde o mais conhecido é o Lacuna Tropical que ela define como “laboratório de experiências de música eletrônica e discotecagem em toda sua amplitude e pluralidade.”

Batemos um papo com ela para saber um pouco mais a respeito dos seus projetos e sua relação intensa com a música. Confira agora:

Primeiramente queremos agradecê-la por estar participando dessa conversa. E não tem como começar uma conversa com você sem falar “Alô, alô Tropicaleiraaaaa, tudo bem? O bordão “Alô alô tropicaleiros e tropicaleiras” é uma de suas marcas registradas, como surgiu essa ideia?

Querido, preciso te confessar uma coisa antes de começar minhas divagações sobre esse bordão, esse slogan por assim dizer: acho o maior barato quando me cumprimentam com ele!! Fico muito feliz em ver tantos tropicaleiros e tantas tropicaleiras por aí aderindo ao jeito lacuna de ser!!

E sabe que essa frase veio de uma reflexão que tem sua membrana no rádio? Como estudei audiovisual e sempre fui apaixonada por essa forma de comunicação única e exclusivamente auditiva, sempre fiquei atenta à cultura do rádio e sua ampla movimentação pela sonoplastia e pela trilha sonora. Depois que consegui chegar num consenso sobre o nome deste projeto ao qual tanto me dedico, que é o Lacuna Tropical, resolvi que seria essencial conseguir me comunicar com os ouvintes e as ouvintes de uma forma que fosse única e personalizada. E, ao mesmo tempo, fazia questão de trazer esse jeito tão peculiar que caracterizou a língua portuguesa informal no Brasil.

Enfim, misturei essa coisa que meio que remete a confirmação e estabelecimento de comunicação advinda dos radioamadores (o famoso “QAP”) e que de modo informal é utilizado nas comunicações por ligação telefônica (o famigerado “Alô”) e trouxe isso para um programa que é transmitido por uma rádio com base na plataforma virtual para transmissão de seus conteúdos. Ah sim, e resolvi dar um temperinho extra com esse apelido carinhoso à comunidade de ouvintes, DJs, artistas e apoiadores e apoiadoras do Lacuna Tropical, não é mesmo tropicaleiros e tropicaleiras?

Foto Divulgação | Grazi Flores

Como surgiu sua paixão pela música? Quais são suas lembranças mais antigas relacionadas ao mundo musical?

Minha conexão com a música ultrapassa, certamente, minhas memórias efetivas. De forma concreta, sempre tive muita curiosidade por tudo o que envolve a criação e reprodução do som, o que me impulsionou a estudar, ainda criança, violino e canto. Poderia dizer que minha genética com aptidão pra música, um ambiente familiar musical e uma liberdade para a incessante pesquisa e desenvolvimento dentro do âmbito do som fez com que eu tivesse certa sensibilidade e sede pelos desafios que a música me instiga em seus diversos níveis de infinitas possibilidades.

Por volta dos 22 anos, eu iniciei mais a fundo meus estudos e desenvolvimento dentro da discotecagem e, posteriormente, da produção de música eletrônica. Desde então, sigo mergulhando em imensos e profundos caminhos de expressão artística em suas diversas formas com emprego cultural na cena e na sociedade brasileira, em específico.

Fale um pouco sobre os seus projetos.

Ao longo dos anos, ainda iniciais, de minha carreira na discotecagem, já desenvolvi alguns projetos, tais como:

  • a discotecagem nos toca-discos e o garimpo de discos de vinil
  • a residência no saudoso Alto da Harmonia
  • produção da música utilizada como vinheta no programa do Lacuna Tropical
  • produção de uma música, a “Circunflexo”, lançada pela label filhos do nada
  • DJ residente, curadora e criadora artística do rolê virtual Sessão em Casa, juntamente com Beto Machado
  • DJ residente e apresentadora de programas via Twitch pelo coletivo Uh! Manas TV
  • integrante da equipe da rádio dublab Brasil
  • colaboradora na loja de discos Patuá Discos
  • fundadora do Lacuna Tropical

Enfim, a lista de atuações e projetos que desenvolvo dentro da música é gigantesca. Posso dizer que minha vida é inteiramente cercada pela música: ô sorte, né?

Mas como a devida criadora, preciso aproveitar e dar uma dichavada no Lacuna Tropical, criatura da qual tenho imenso orgulho.

A discotecagem me impulsionou para a criação daquilo que, atualmente, é o que chamo de laboratório de experiências de música eletrônica e discotecagem em toda a sua amplitude e pluralidade. Pelo Lacuna Tropical desenvolvi o programa para rádio que é transmitido em duas edições semanais pela dublab Brasil; também estou desenvolvendo o projeto de entrevistas com DJs e protagonistas da cena chamado >> O SOM DA PANDEMIA, transmitido pela dublab Brasil e Function FM; por fim, também temos o sensacional festival Vibe Lacuna.

O festival Vibe Lacuna foi desenvolvido como um evento totalmente virtual que junta coletivos, festas, labels, DJs e artistas para um imenso encontro musical voltado para a discotecagem de gêneros como rap, hip-hop, música brasileira, reggae, downtempo e jazz, mas com foco na música eletrônica.

Já em planejamento e produção da III edição, o Vibe Lacuna conta também com a divulgação de informações completas sobre todas que participarão do festival com releases publicados nas plataformas do Lacuna Tropical, bate-papos pelo Instagram antes do festival (disponibilizados também no IGTV do Lacuna) e discotecagens durante o festival (por plataformas como o Twitch e as rádios dublab Brasil e Function FM).

Aproveito o espaço pra compartilhar o link do evento no Facebook e da página do Lacuna Tropical.

 O Festival Vibe Lacuna é um projeto que proporciona uma diversidade de atrações. Como é produzir todo esse conteúdo? Você faz tudo sozinha?

Bixo, confesso que é um tanto insano! Nesta terceira edição eu até tenho algumas ajudas pontuais, entretanto ainda não chega a ser o equivalente a um trabalho em equipe. Ainda assim, é importante listar aqui que Lorran Nascimento e Pedro Bassul têm facilitado meu trabalho para que o festival aconteça.

Então, com isso, eu me encarrego de fazer o escopo, planejamento, organização, criação/produção de conteúdo, postagem nas plataformas das redes sociais e do blog, contato com participantes, gerenciamento da agenda do festival, apoio na produção durante o festival etc.

Na verdade, é importante ressaltar que o festival Vibe Lacuna não é um evento virtual que se limita ao aspecto das apresentações musicais (o que já somam, por si só, conteúdos suficientemente xambrantes hehe): também são desenvolvidos bate-papos ao longo das semanas que antecedem o festival em si, para que o público conheça mais a fundo os coletivos, festas e labels que terão pistas com curadoria feita por essa galera. Além, é claro, do bate-papo que também rola com apoiadores e participantes do festival.

Aproveito pra comentar que a edição desta vez está ainda mais ousada: com um número maior de artistas participantes (somos mais de 100) que desenvolverão seus sets ao longo de 7 dias de evento virtual, acontecendo em múltiplas plataformas e ainda contando com pistas simultâneas em alguns dias do festival.

Foto Divulgação | Grazi Flores

Agora vamos falar de Lacuna Tropical! Como surgiu o projeto?

Surgiu em 2017, mais especificamente em junho, e tinha como principal objetivo apenas ser um espaço onde eu pudesse centralizar a postagem dos sets que eu fazia. Esse era o escopo inicial, que eu fiz quando ainda estava nesse processo de início dos estudos na discotecagem.

E se tem uma coisa que acabei mantendo desse o princípio é o conceito artísticos desses conteúdos: gosto de fazer não apenas o set, mas também uma ambientação estética no formato imagético e literário do que desenvolvido musicalmente no set.

O engraçado é que este sempre foi um dos meus projetos mais despretensiosos: não pensava muito em expandir sua atuação. No final das contas, o desenvolvimento do Lacuna aconteceu de uma forma extremamente orgânica e espontânea atendendo a demandas internas e externas ao longo de sua evolução.

Você é uma DJ que tem um apreço pelo Vinil, como é processo de “garimpo” da Grazi Flores? Tem alguma história que gostaria de contar?

Ah, impossível não acabar tendo no mínimo um respeito pela mídia que foi responsável pela possibilidade do surgimento e desenvolvimento da profissão DJ, né? E o vinil é uma forma muito peculiar de música: possui a forma do som em todas as suas harmonias e dissonâncias prensadas na goma, possibilitando que aquele som passe por histórias e seja também o pano de fundo de tantas outras, todas marcadas em seus sulcos.

Dito isso, acho que uma das experiências mais marcantes pra mim, quando essa ficha realmente caiu pra mim, foi quando recebemos um lote de discos vindos diretamente de Cabo Verde para a Patuá Discos: abrir os discos, sentir e ver aquela fina areia que estava ainda incrustada na mídia, as marcas feitas com unha (talvez na tentativa de limpar o disco), os desgastes na capa… acho que tudo o que envolve um disco acaba por se tornar muito visceral e carregado de memórias, mesmo que estas não sejam contadas ativamente pela pessoa que possuía o disco inicialmente. 

E claro, todo garimpo vira uma história pra se contar: a feira que visitamos e dedilhados os discos sem poder pré-escutar suas tracks (e achando alternativas para selecionar se a bolacha seria ou não adicionada às novas aquisições), o lote que algum DJ está vendendo (com pedradas vindas de seu acervo e pesquisa musical)… Aliás, até mesmo os discos que ganhamos têm história, convenhamos, né? Tenho discos que ganhei em viagens, tenho discos que ganhei pelo meu trabalho, tenho discos que ganhei de amigos… 

Acho que para melhor contextualizar, vou citar aqui ao menos duas lembranças. A primeira delas, eram as feiras que aconteciam na Void. Por lá, além de amigos como o Mimi, com a Show Me Your Case, também tinha a presença da galera da Patuá Discos nos tocas (inclusive eu mesma toquei numa dessas feiras, girando minhas bolachas eletrônicas) e muitos discos e trocas de informações e garimpos ricos em sons únicos. A outra lembrança seriam as in-stores que rolam pelas lojas de discos. Aqui, obviamente, cito duas in-stores que eu tive o prazer de presenciar: a da Rush Hour e da Patuá Discos (a famosa Vai Na Fé! na qual também dividi os toca-discos com uma galera de peso. Isso sem contar no garimpo natural que rola.

Nas suas apresentações como DJ tem alguma ou algumas que te marcaram?

Caramba, que pergunta difícil! Quer dizer, todo set que faço me leva a uma nova perspectiva sobre a cultura da discotecagem, sobre formas de mixar, pesquisas musicais e afins. Uma coisa que eu sou obrigada a dizer: tocar com vinil é uma experiência indispensável para conseguir encontrar sua personalidade dentro da mixagem. Sim: discotecar com os toca-discos dá um ritmo completamente único para o trabalho de seleção, ajuste de pitch e execução artística da mixagem.

Sendo assim, toda vez que discotequei com vinil, foi marcante pra mim de alguma forma.

Agora, dos últimos tempos, posso dizer que fazer lives pelo Twitch trouxe uma vivência única e próxima com artistas que não imaginava encontrar ou trocar uma ideia, ou mesmo dividir o line. Certamente tenho desenvolvido um estilo cada vez mais próprio de explorar ao máximo o equipamento que tenho com estilos diversos dentro da música eletrônica: vem da forma como recebo uma pista que estava ouvindo música brasileira ou rap para um som eletrônico que deságua no Techno (quase que inevitavelmente haha).

Acho que as lives do final do ano passado (2020) foram especialmente inspiradoras e me instigam a pensar em novos formatos de programas para contextualizar artisticamente a paixão que tenho em descobrir sons que combinam entre si, mesmo não sendo tão óbvia a combinação.

Sessão em Casa, Uh! Manas TV, Segunda Sem Lei, Soundkrakerz, Domingueira Sessions, Beatplay, Cultura Cosmo (Fluxo Cósmico), Etnias, Space Monkeys TV, Coletivo Hangover Convida… A lista de rolês dos quais participei nos últimos meses segue se expandindo e me inspirando a cada live feita. Isso sem contar em outras tantas que organizei por conta própria como o Apelooou, A Vida É Boa – Bora Xambrar! O Sol Vai Brilhar Para Todos, Aeee Truta, Era Som O Que Me Faltava, Game, Obras >> Em Construção, e outras (contando também aquelas que ainda estão por vir, claro!).

Você trabalha no Paraíso de todo amante de música, uma loja de discos, como é o dia a dia na loja?

Olha, confesso que o dia a dia, em específico atualmente, se resume às funções administrativas de atendimento ao cliente, gerenciamento de pedidos, gerenciamento das redes sociais, criação de conteúdo…

Mas antes da pandemia… Ah, aí era outra coisa: era o lote novo de discos que chegavam e precisavam ser registrados e catalogados, eram as in-stores de fato acontecendo ali: lançamento de discos, pocket shows, discotecagens, cervejas… E eu ali, na função de registrar, postar, fazer as lives, interagir, organizar tarefas (como a coleta de canetadas nos discos, entrega de discos vendidos em uma pré-venda etc). Ali rolava a produção de um evento de um jeito roots mesmo: a gente botando a mão na massa, correndo com imprevistos (como o esgotamento do livro da Lorena Calábria e a equipe, com um salve especial pra Mari da Cobogó, correndo atrás de mais cópias para dar conta da demanda): meu trabalho misturava o aprofundamento musical (num recorte claramente voltado pra cultura do vinil) com produção de eventos para a divulgação e também comercialização da música.

Então, para além das demandas de um comércio, a loja pulsava diariamente uma economia criativa própria de São Paulo com temperos de outros estados e países, tanto nas agulhas quanto nos bate-papos.

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