Vamos dar um pulo em Curitiba para prestar essa homenagem a uma DJ importantíssima na cena local, Bruna Alessandra de Freitas, também conhecida como FRACTA, um ícone na cena musical da capital paranaense que também vem se apresentando em outras regiões do país ao longo de mais de 10 anos de carreira.
Nascida em Curitiba, Bruna teve seus primeiros contatos com a música na infância. Sua mãe sempre incentivou o estudo musical em casa, o que a levou a participar de projetos culturais na prefeitura local. Ela conta que sempre ouvia em casa referências da black music como Marvin Gaye, Etta James, Whitney Houston, e vários outros artistas que apresentavam uma excelência na construção dos arranjos e potência vocal. Esse ambiente cheio de música a levou a participar de corais natalinos na igreja, e lá surgiu o interesse por aprender a tocar piano.
“Durante toda a minha infância fui incentivada pela minha mãe a cantar e tocar instrumentos, já que ela cantava e tocava violão para mim desde bebê para me acalmar.” – FRACTA.
Aos 10 anos, começou a estudar piano erudito, o que deu a ela uma boa noção da teoria musical. Mas devido à mudança de bairro/região repentina por motivos de trabalho de sua mãe, Bruna teve que interromper o terceiro ano, não conseguindo se formar. Ainda fascinada pelo canto e presenciando seus estudos diários, ela decidiu na adolescência tentar o vestibular das Belas Artes/PR para canto erudito. Foi um aprendizado muito intenso!
Ao longo dos treinos, a curitibana percebeu que não era bem aquele caminho que sentia vontade de seguir. Foi quando surgiu um interesse em estudar no Conservatório de Música Popular Brasileira, ela acreditava ser um ambiente mais descontraído, com professores renomados na cultura recente, com adaptações e teorias que se enquadravam na sua vontade de aprender.
“Foi uma experiência maravilhosa em vários aspectos! Como se portar nas apresentações, como criar improvisos, como extrair uma verdadeira essência artística, como aceitar e respeitar a diversidade musical universalmente e muitas outras coisas que carrego comigo desde então. Um aprendizado com excelentes Mestres!”, conta.
Fracta teve uma forte influência da black music, essa influência a levou a procurar por lugares que apresentassem sonoridades como o Hip-Hop, e ela conta: “sempre fui apaixonada por graves bem construídos no break beat.”
Com essa sede de se aprofundar nos grooves, ela procurou uma escola que a ensinasse a produzir suas próprias músicas. Foi então, em meados de 2010, que começou um curso de produção musical na AIMEC/Centro Europeu, onde se aprofundou na música eletrônica. Lá, Bruna descobriu uma riqueza enorme de vertentes e um mundo maravilhoso de oportunidades. Com esse novo horizonte, conheceu e se interessou profundamente por ele. Ela conta que conheceu as raves, começando pela Tribaltech 2012, em seguida Xxxperience e Tribe. “Assisti nelas apresentações de artistas que venerava. Foi um verdadeiro encantamento por tudo que presenciei.”
Nesse movimento, Bruna se tornou uma frequentadora assídua do Club Vibe, ela diz que foi uma fase muito arrebatadora e essencial para a criação das raízes que tem até hoje nesse universo.
Seu começo na discotecagem foi através de amigos, segundo ela foi um verdadeiro fiasco. Os equipamentos eram um par de CDJ 100 e um mixer VMX 100 Pioneer. Eles não marcavam BPM e as tracks tinham alterações de tempo sem explicação alguma.
Cada mixagem era uma verdadeira aventura! Mas aquela sensação repentina de mixar perfeitamente, com as pessoas vibrando ao seu redor a conquistaram definitivamente. Ela diz ser uma sensação tão cativante que se tornou visceral – desde quando está pesquisando em sua casa, até quando seleciona o que tocar na hora da apresentação, como ela mesmo conta:
“Como DJ, a leitura das pessoas absorvendo minha energia sempre fluiu naturalmente. Descobri nesses momentos um verdadeiro amor pelo que eu faço até hoje. Sinto uma conexão muito genuína entre mim e quem está me assistindo. Uma verdadeira reciprocidade. Momentos que marcam nossas vidas pra sempre.”
Uma pessoa que foi contagiada por essa energia foi a DJ Nati M., artista super importante da capital paranaense, que teve Fracta como uma de suas inspirações. “A Fracta foi pra mim uma inspiração no começo da minha carreira, uma mina DJ local que arrasava tocando,” conta Nati.
Nossa homenageada falou um pouco sobre gigs marcantes que realizou, começando por sua primeira apresentação significativa profissionalmente que foi no Club Vibe, em Curitiba. Ela conta que recebeu um reconhecimento por todas aquelas experiências que teve ao se apresentar entre amigos, foi uma fase onde pesquisa e técnica estavam sendo aprimoradas, mas já percebia que várias pessoas procuravam saber aonde a nova DJ iria se apresentar.
“Essa oportunidade foi muito valorosa, tenho muita gratidão pela oportunidade que recebi, e até hoje me sinto muito bem quando recebo convite para me apresentar por lá. É como se eu estivesse em casa, concretizando um sonho nostálgico das lembranças que tenho como espectadora.”
Outra experiência significativa foi em 2014, quando a DJ Curitibana foi convidada para tocar no Winter Paradise, em Lages/SC. Quando ela foi contratada, não sabia das proporções de sua apresentação. Ao entrar na cidade, viajando de carro, ela conta que foi surpreendida por um outdoor com uma foto dela como headliner. Ao entrar no evento percebeu que havia camisetas, copos e até carros com sua logo. A apresentação foi excepcional, equivalente à expectativa que sentiu daquele público por ela. Esse episódio foi um marco em sua carreira, determinando sua confiança e maturidade profissional.
Outro momento marcante foi em setembro de 2015, em sua passagem pelo Rio de Janeiro. Bruna, que também é conhecida pelo seu apelido de infância “Naná”, atuou como promoter. “Sempre fui amante e desbravadora da natureza, e encontrei em Búzios um lugar incrivelmente paradisíaco e encantador.”
Procurando a cura de uma intensa depressão, Naná decidiu viajar, conhecer novos ares e ficar perto do seu lugar predileto no mundo, o mar!! Na época, muito doente, ela desistiu da música por inteiro, como produtora, cantora e também como DJ. Desistiu de si própria, se perdeu completamente.
No Rio, mais precisamente na região dos lagos, Bruna recebeu a oportunidade de trabalhar nas praias, convidando pessoas a conhecerem o Privilège Búzios. A curitibana estava só de passagem e voltando a encontrar seu lugar no mundo. Repentinamente no início de 2016, foi chamada pelos produtores do Club para uma reunião, e lá disseram que ela havia sido indicada por outro artista para se apresentar como DJ, e por qual motivo nunca havia mencionado que seguia essa carreira anteriormente. Naná conta que ficou totalmente sem palavras, ela mostrou seus sets, sua história e suas referências em Curitiba e recebeu instantaneamente um reconhecimento por ter trabalhado perseverantemente, vestindo a camisa do clube por vários meses, e por isso ganhou uma gig em um dos principais eventos apresentados por ele. A DJ se apresentou na We Love Búzios, promovido pela Privilege, no lugar mais lindo que seus olhos puderam presenciar – o Silk Beach Club. Tudo aquilo que aconteceu naquele período entre depressão/frustração/reencontro se deve totalmente à um evento do acaso, totalmente inexplicável. Um verdadeiro presente do universo.
“Foi a minha cura, o meu reencontro comigo mesma e a certeza de que meu caminho era esse: a música – mesmo desistindo dela, ela veio ao meu encontro.” – FRACTA.
O que marcou também foi sua primeira apresentação como residente do coletivo 4×4, em julho de 2018. Ela estava grávida de 8 meses da Alice. Foi um momento peculiar em sua carreira, uma apresentação inesquecível! As pessoas começaram a perceber que ela estava grávida enquanto tocava e isso causou um alvoroço, demonstrando admiração durante todo aquele set de 3 horas. Ela sentia sua pequena vibrar dentro dela durante o turbilhão de coisas boas que sentia a cada virada. Foi uma sensação absoluta de satisfação pelo que decidiu fazer.
“Sinto até hoje que valeu a pena cada segundo que me dediquei para quem sempre esteve disposto a me receber e ouvir.” – FRACTA.
E no último ano, antes da pandemia, a boa filha à casa tornou. Em uma das noites assinadas pelo coletivo 4×4, no Club Vibe, Fracta fez um set que acredita ser um dos melhores sets que apresentou até hoje. Ela conta que sentiu uma diversidade do público que ainda não tinha ouvido o seu som. Lá tinham pessoas que gostavam de uma linha mais houseada, outras que estavam lá para ouvir um techno quase hard que tocaria em seguida. Foi uma sensação absurda perceber que todas aquelas diferenças de vertentes simplesmente foram inexistentes durante toda aquela resposta que teve da pista no período de sua apresentação. Uma noite que ficará na sua memória pra sempre, porque pode perceber genuinamente que sua personalidade e essência na hora de se apresentar ultrapassam qualquer tipo de barreira musical.
Perguntamos quais pessoas foram importantes na construção de sua carreira, e ela logo disse:
“Indiscutivelmente minha mãe primeiramente, por ter me transmitido tanto amor pela música desde muito pequena. Depois meus amigos que sempre me apoiaram e me incentivaram a continuar, tocando mesmo em adversidades que enfrentei pelo caminho, por muitas vezes pensei em desistir de tocar.”
Ela também nos falou sobre suas influências musicais mais importantes na música eletrônica, citou nomes Trentemoller, Stimming, Nicolas Jaar, Carl Craig, Ben Klock, Traumer, esses mais inicialmente, e recentemente cita como inspiração artistas como ANNA, Charlotte de Witte, Anthony Rother, Blawan, INSOLATE, Mark Reeve, Cari Lekebusch, Assembler Code, Inland, Planetary Assault Systems e vários outros.
Hoje Fracta faz parte do Coletivo 4×4, núcleo que vem desenvolvendo um trabalho incrível na cena local.
“É uma experiência muito satisfatória profissionalmente me apresentar para o público da 4×4, sempre sinto uma conexão que flui naturalmente com a pista quando me apresento no nosso rolê. Além de me sentir muito representada pelas ideias de comportamento e posições sociais que sempre são apresentadas durante os eventos.”
Ela integrou o 4×4 a convite de outro DJ muito importante da cena de Curitiba, o Nassur. Veja o que ele diz sobre ela:
“Primeira vez que eu vi a Fracta (Nana) tocando, acredito que foi em 2013, eu tinha acabado de me formar em Discotecagem pela Yellow. E a vi dominando as CDJs com muita intimidade, sua pesquisa musical afiada somada a sua construção musical foram incríveis.
Até que no ano seguinte em 2014 numa edição da Tribaltech eu e a Nati M. a conhecemos melhor e nos tornamos amigos desde então, trocando experiências e conhecimentos.
A Fracta dessa nova safra de DJs mulheres é uma das melhores, domina vários estilos musicais, mixagens sutis, sets inteligentes e contagiantes compõem o seu projeto. Uma das personalidades mais importantes da cena de música eletrônica independente de Curitiba, sem dúvidas. Em 2017 a convidei pessoalmente a integrar o time de residentes do Coletivo 4×4, hoje não faço mais parte do time, no entanto, ela permanece firme e forte, fazendo aquilo que mais ama que é a música.”
Para finalizar, Bruna nos contou o que planeja para o futuro como artista, e disse que o grande foco é botar em prática sua profissão como produtora. Ela já vem desenvolvendo e praticando há alguns meses, e recentemente suas produções têm tomado forma e acredita que coisas boas estão surgindo por aí nesta área muito brevemente.