ÍCONE | DJ VINO – Um Shot de Pop

Nós da Colors tivemos a oportunidade de bater um papo mais que especial com o DJ Vino. Ele que é conhecido na cena Pop pelos sets incríveis e energéticos e por ter um feeling de pista impressionante, e essas são apenas algumas das inúmeras qualidades deste Ícone do Pop. 

“A música foi muito significativa durante o meu amadurecimento sexual, pois foi através da música que consegui driblar as minhas inseguranças e incertezas, para achar forças e me assumir como homem gay.”DJ Vino.

Nesta conversa ficamos sabendo um pouco mais da trajetória dele como DJ e momentos mais que especiais da carreira dele. Confira agora a nossa entrevista com o DJ Vino:

Conhecemos bem o DJ Vino, mas antes dos palcos, quais foram os caminhos que você percorreu até chegar nas pick-ups?

A música é muito presente na minha vida desde a minha infância, literalmente. Lembro-me de muito pequeno, cerca de 2 ou 3 anos de idade, já ouvindo discos infantis que eu ganhava de presente nos aniversários, como Balão Mágico, Trem da Alegria e Xuxa. Também lembro de ouvir Tom Jobim, Vinícius de Moraes, Rita Lee, Milton, Gil e outros grandes nomes da MPB, sempre que andava de carro com meus pais. 

Conforme fui crescendo, meu gosto musical também foi amadurecendo. Lembro de ganhar meus dois primeiros CDs aos 10 anos de idade, um era uma coletânea de funks feita pelo MC Marlboro chamada “Funk Brasil” e o outro era uma coletânea de dance music da Som Livre chamada “Top Surprise”. Guardo esses CDs até hoje com muito carinho. 

Aos 15 anos me vi fã, ao mesmo tempo, de Spice Girls e Marilyn Manson, mas aquele tipo de fã de consumir tudo, além da música: clipes, shows, revistas, posters, camisetas etc. Nesse momento, eu também me encontrei como homem gay. 

A música foi muito significativa durante o meu amadurecimento sexual, pois foi através da música que consegui driblar as minhas inseguranças e incertezas, para achar forças e me assumir como homem gay para mim mesmo, deixando de lado todo e qualquer “pré-conceito” que eu tivesse absorvido ao longo da minha infância. Sem medo de assumir esse “rótulo”. Desde então consumo muita música pop, alternativa e rock, como gosto musical. A música esteve e está presente em todas as fases da minha vida. Foi a minha grande companheira durante a faculdade e por todos os estágios que passei antes de me formar, inclusive, nesse momento, estou ouvindo música. (o “show” Infinite Disco, da Kylie Minogue).

Atualmente, quando não estou assistindo a um filme ou série, eu estou o tempo todo ouvindo música, seja pra me atualizar, ou pra relembrar aquelas canções que mexem comigo de alguma forma. Tenho duas playlists particulares, que me acompanham o tempo todo, uma com músicas mais calmas e a outra com músicas mais agitadas. Como passo a maior parte do meu tempo ouvindo músicas, fico de birra quando recebo alguma mensagem, porque tenho que parar de ouvir as músicas para ouvir a mensagem. (rsrsrsrs

Para mim, ouvir música é uma experiência de imersão, gosto de ouvir por inteiro, com qualidade. Faço questão de ter bons fones, mesmo que para uso pessoal no dia-a-dia. Quando ouço música pelo PC, sempre ligo o home-theater, para conseguir sentir 100% da música, principalmente o grave.

Festa @pipperclub - RJ

Há 9 anos encontramos o DJ/VJ Vino nas pistas. Como surgiram essas oportunidades? De que forma a música interfere na sua vida desde que você se entende por gente? 

Na minha fase “pré adulta”, quando eu tinha 17 anos, comecei a frequentar uma boate alternativa no Rio, chamada Bunker94. Lá era um verdadeiro reduto da galera alternativa, clubber e underground. Tinha três pistas com som diferente e a cada dia da semana os ritmos iam se alternando na pista principal. Lá eu conseguia curtir um bom rock às sextas e techno aos sábados e foi lá que comecei a sonhar em ser DJ, sempre tentando adivinhar qual seria a próxima música e, na minha cabeça, tentar encontrar qual seria a melhor opção para a próxima faixa. Porém, esse sonho sempre ficou muito em segredo, pois pra mim, ser DJ era algo muito inalcançável. 

Em 2011, durante o Rock in Rio, rolou uma festa que tinha como um dos propósitos lançar novos DJs na cena alternativa, através de um concurso on-line. Foi então que eu resolvi tentar. Este concurso consistia em montar uma tracklist de 10 faixas, na ordem que você gostaria de ouvir na pista. Essas tracklists passariam pelo crivo dos produtores da festa pelos, que escolheram as 10 melhores listas para a votação na internet. Os responsáveis pelas 3 tracklists mais votadas teriam a oportunidade de tocar na festa. Eu liderei a votação nas primeiras semanas do concurso até que, por causa de um bug, o contador de votos zerou e, assim, eu fiquei em 4º lugar. De toda forma, fui à festa para curtir e conhecer o pessoal. Um tempo depois deste concurso, um produtor de festas para ursos aqui no Rio queria começar um novo projeto e estava procurando um DJ novato, sem vícios da profissão, que tivesse uma proposta de som diferente do que já vinha sendo feito na cena LGBT na época. Um amigo em comum, que tinha votado em mim no concurso virtual, me indicou para o produtor das festas bear, que entrou em contato comigo. Expliquei a ela que eu nunca tinha tocado na vida e meu foco era no “pop cru”, como eu chamava na época as versões rádio/álbum – naquela época a música eletrônica, em especial o house tribal, era o tipo de som predominante da cena LGBT, as festas que tinham como foco principal o pop, ainda estavam muito no início. Foi então que, no dia 14 de novembro de 2011, tive a oportunidade de tocar pela primeira vez. 

Um dos DJs que tocaram neste evento bear, do qual participei, gostou muito da minha proposta de som, justamente por ser versão não remixada e me ofereceu a oportunidade de tocar numa festa que ele fazia às quintas-feiras na boate La Cueva. Então, no dia 05 de janeiro de 2012, comecei a tocar oficialmente e, graças a Deus, nunca mais parei. 

Durante o carnaval de 2012, um outro produtor de role bear me convidou pra tocar numa festa dele, no Galeria Café. Eu lembro que temia muito, porque, até então, era o maior público para o qual eu iria tocar até então. Graças a Deus deu tudo certo e o pessoal curtiu muito meu som, fazendo com que eu recebesse o convite de me tornar residente nesta festa mensal para ursos. Foi nesta festa que tive a oportunidade de tocar com um dos DJs que mais admiro até hoje e que eu acompanho desde a época da Bunker. Este DJ e produtor de eventos me convidou para alguns eventos dele, que não eram focados na cena bear, mas sim na cena LGBT em geral e assim eu fui conseguindo abrir cada vez mais as portas para eventos dentro da cena pop LGBT.

Festa @espacofenixrj - RJ

Atualmente muitos DJs fogem do “cru”, mas como sabemos bem, você é um DJ que valoriza muito versões originais. Quais gêneros e estilos você mais se encontra tocando e garante ser sua especialidade? Como e por que esses gêneros, ou esse gênero musical, ganharam espaço na sua vida e profissão? 

Sem dúvidas o que eu mais me sinto seguro em tocar é o pop, leia-se: pop, pop dance, pop funk, pop rock. Muito por conta do meu gosto musical e pelo fato de eu consumir pop no meu dia-a-dia, este foi o ritmo que me fez começar como DJ e que predomina no meu trabalho até hoje. Ao longo desses quase 10 anos de profissão acompanhei a inserção de outros ritmos no pop – enquanto gosto popular da maioria das pessoas – como por exemplo o funk e, mais atualmente, o reggaeton (que são dois ritmos bem antigos e foram marginalizados por anos, mas finalmente conseguiram sua ascensão para o lugar de brilhantismo no qual já deveriam estar desde os anos 90/2000). 

Também por muita influência do meu gosto pessoal, consigo me virar bem no rock, porém, pela mudança do gosto do público em geral, hoje em dia quase não há mais festas voltadas para o rock. Tive oportunidade de tocar em algumas festas de rock durante esses anos, mas realmente o rock ficou muito esquecido nos últimos anos. 

Eu me entendo, sim, como um DJ de POP, principalmente na totalidade do tempo: popular. Por isso, o meu repertório é bem amplo e vai do pop em sua essência como Britney, Aguilera, Jessie J e outros, até funk, sertanejo e pagode (que inclusive tem ganhado cada vez mais espaço na cena LGBT). 

Este foi o ritmo que me fez começar como DJ e que predomina no meu trabalho até hoje. Raríssimas vezes escolho uma versão ao vivo, ou até mesmo um remix (mais no caso de quando a música é lenta e eu consigo alguma versão não muito distante dos vocais originais). Mas sempre prestando atenção no que o público gosta de consumir numa pista de dança, especialmente quando é uma música com coreografia.

DJ Vino por Gabriela Neto - @gabinettooo
DJ Vino por Gabriela Neto - @gabinettooo

Você é conhecido como um dos DJs mais fofos e carismáticos do Rio de Janeiro. Apesar disso, o que te estressa e te tira do sério quando o assunto é trabalho?

Normalmente eu fico muito concentrado quando estou tocando, justamente para não cometer erros. Por mais à vontade que esteja ao tocar em um determinado local, ou festa, e já conheça aquele público, eu me esforço ao máximo para não cometer nenhum erro. Ainda que eu já esteja acostumado com determinadas viradas de música, eu me concentro para nada sair errado 

Devido ao meu alto grau de exigência comigo mesmo, com o trabalho para o qual fui contratado e sempre me esforçando para entregar o melhor para o público, o que mais me tira do sério é alguma pessoa desviar a minha atenção e, com isso, eu cometer algum erro, ainda que este erro seja imperceptível para o público. Sei que não sou perfeito, mas me cobro muito quando cometo erros. 

“…aquela multidão toda começou a pular no mesmo ritmo e a dançar a coreografia do clipe. Foi a emoção mais forte que já vivi na minha vida e vai ficar marcada para sempre na minha alma.” DJ Vino.

Já te vimos em diversos palcos, escutamos o seu som e sentimos a energia que seus sets transmitem. Durante todos os seus quase 10 anos de carreira, quais foram as maiores experiências que você já teve?

Toda pista/festa é importante, principalmente quando a galera vibra e devolve aquela energia gostosa, mas, graças a Deus, tive muitas ocasiões bastante marcantes na minha carreira, não caberiam tantas nessa resposta, mas, mesmo com receio de acabar fazendo com que alguém se sinta desprivilegiado, vou arriscar enumerar as que mais me marcaram: 

– Em 2013 toquei numa festa em São Paulo chamada Bear Cantho, que acontecia mensalmente na extinta Cantho Club. Fui convidado para tocar nesta edição que aconteceu durante o feriadão da Pride SP, a casa estava bem lotada e, contra a vontade do produtor, eu toquei “Show das Poderosas”. A cena LGBT paulistana ainda estava muito dominada pelo tribal house e era praticamente inaceitável tocar um “funk”, por mais pop que fosse, numa festa, naquela época, porém, essa música estava muito em alta e eu resolvi arriscar, então deixei pro final, exatamente a última música do meu SET. Na hora que aquela buzina (do início da música) tocou nas caixas de som, a boate inteira gritou de alegria e cantou a música até o final. Sem dúvidas, essa emoção eu vou levar para o resto da vida. 

– Quando toquei no aniversário do extinto TV Bar, em dezembro de 2016 e, de repente, um cliente da boate, conhecido meu, e que sabia o quanto eu já era muito fã da Pabllo naquela época, me apresentou a própria. Primeiro eu fiquei sem ação, justamente por já admirar demais o trabalho dela, mas quando o impacto inicial passou, eu não me contive e perguntei a ela se ela se importaria de eu tocar uma música dela. Muito educada ela respondeu: “só se eu puder fingir que sou DJ. Na mesma hora eu soltei o clipe de “Open Bar” (o TV Bar tinha esse nome por ter diversas TVs espalhadas pela pista e possibilitar tocar com vídeos) e a Pabllo, muito feliz, subiu na cabine, pegou meu fone e ficou fingindo que era DJ. Foi um sonho se tornando realidade, bem diante dos meus olhos. 

– Quando fui convidado para tocar numa festa bear em Buenos Aires, em 2013. Eu estava muito no início da carreira e ter a oportunidade de tocar em outro país foi, sem dúvidas, uma das maiores emoções que já vivi. Como eu era um “gringo” naquela festa, resolvi levar um pouco do som brasileiro pra eles e toquei um remix de “Show das Poderosas”, que um amigo produziu, além de ter tocado um remix de “Surra de Bunda”, feito pelo Fatboy Slim. Por incrível que pareça, a galera surtou e respondeu super bem aos “funks cariocas”. Eu não podia deixar de dar um gostinho da minha “carioquice” pra eles. (rsrsrsrs)

– Quando toquei na parada LGBT do Rio pela primeira vez. Ver a Av. Atlântica lotada, aquele marzão lindo e todo mundo celebrando a diversidade, é uma emoção que não tem como explicar, só vivendo para saber. 

– Quando toquei pela primeira vez na parada LGBT de Caxias. Na época “Gangnam Style” estava muito em alta e, durante meu SET, o trio no qual eu estava tocando parou em frente à uma praça bem grande, que estava completamente lotada de pessoas. Um dos caras da produção do trio falou:aqui é o melhor ponto da parada, toca uma música bem animada”. Não perdi tempo e dei play no hit do PSY e, eis que então, aquela multidão toda começou a pular no mesmo ritmo e a dançar a coreografia do clipe. Foi a emoção mais forte que já vivi na minha vida e vai ficar marcada para sempre na minha alma.

Sobreviver à pandemia está sendo muito complicado, ainda mais para profissionais do setor de eventos. Durante esse período, você precisou se reinventar e/ou recorrer a outros tipos de trabalho? Como tem sido para você? DJ/VJ é sua principal renda? 

Realmente têm sido tempos muito difíceis para todo e qualquer setor do entretenimento, especialmente eventos. 

A música é sim a minha principal fonte de renda, mas, graças a Deus, eu tinha uma boa reserva para emergências. Reduzi completamente meus gastos ao extremamente necessário e consegui sobreviver durante este período. 

Eu mudei completamente meus hábitos, para poder reduzir meus gastos, então, automaticamente, me mantive isolado em casa. Precisei reorganizar meus pensamentos para não surtar, ou ter alguma crise emocional. Precisei entender e aceitar que o mundo inteiro, literalmente, está passando por esse momento juntos. Não está sendo fácil, mas só de estar vivo e inteiro agora, já é o melhor que eu poderia ter. 

DJ Vino por Caio Oliveira - @caiokoo

“…percebi que não fui convidado a tocar em algumas festas por, exatamente, não ter um corpo padrão…” DJ Vino.

Recentemente você deu uma entrevista ao site PHEENO onde fala sobre preconceitos que sofreu referentes ao seu corpo. Como esse preconceito te afeta na vida profissional e no pessoal?

Eu sou gordo desde meus seis anos de idade (estou com 38), eu simplesmente não sei como é ser magro, nem tampouco padrão. A fase mais difícil da minha vida, em relação ao meu corpo, foi, sem dúvidas, a minha adolescência. Ao mesmo tempo que eu tinha que lidar com as minhas descobertas sexuais, ainda que tardias, eu tinha que lidar com todo o preconceito que um qualquer jovem pré-adolescente fora dos padrões sofre. 

À medida que fui amadurecendo, também fui lidando melhor com meu corpo e meus “defeitos”. Boa parte dessa autoaceitação aconteceu somente na fase adulta, com a proximidade e conhecimento da comunidade ursina. Conhecer pessoas como eu, que se sentem atraídas por corpos como o meu, foi uma grande ajuda na minha aceitação. Hoje em dia sou muito bem resolvido com meu corpo como um todo, me amo do jeito que sou e admiro cada vez mais cada parte de mim que não se encaixa em algum padrão.

Já sofri preconceito (por ser gordo) na minha vida profissional sim, nunca foi declarado, mas percebi que não fui convidado a tocar em algumas festas por, exatamente, não ter um corpo padrão, o que, na cabeça do produtor, automaticamente estaria fora do que o público alvo daquela produção consome. Infelizmente isso é uma realidade no meio artístico de DJs. 

Quando comecei a perceber esse tipo de rejeição, logicamente, fiquei chateado, mas, com o tempo, aprendi a não me importar com isso. A verdade é que quem sai perdendo é o público daquela pista, não eu. Se realmente as pessoas que frequentam aquele rolê preferem um som tocado por uma “pessoa padrão”, conforme pensam os produtores destas festas, eu prefiro nem estar ali, seja como cliente ou como DJ. 

Nem meu talento, nem meu profissionalismo, nem meu caráter, estão relacionados ao meu tipo físico. 

Ainda não sabemos quando as coisas vão melhorar, mas apesar disso, tem algum projeto futuro a ser lançado ou planos que poderiam nos contar? 

Meu principal plano é sobreviver a isso tudo com saúde. Quando toda essa confusão acabar e as coisas conseguirem voltar ao normal, porque eu tenho sim fé de que, um dia, tudo voltará ao normal, eu pretendo retomar as minhas produções drag (festas nas quais eu proporcionava um concurso drag concomitante) e também penso em começar a investir em uma produção para o público urso, porém, um pouco diferente do que as que já vinham sendo feitas na cidade. 

Para finalizar, criamos uma playlist com as 20 músicas que o nosso Ícone Pop do mês mais tem escutado nos últimos meses. Ouça agora:

Colaboração no texto: Rodrigo Izaú

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