ENTREVISTA | Malka: desde sempre com a Música

Vinte anos de carreira musical e uma trajetória única. Malka atua como produtora musical, compositora, cantora, multi-instrumentista, DJ e educadora, transitando por diversos gêneros musicais em parcerias e projetos solos. 

“Lembro que aos 7 anos de idade me apresentei no teatro municipal de São Caetano do Sul em um recital, tocando o tema de jazz In The Mood, e desde então soube que aqui seria minha salvação ou perdição.”

Malka

Sua versatilidade a leva para lugares como festas eletrônicas, eventos de rap e funk, festivais, orquestras (primeira travesti a tocar na Sala São Paulo), espetáculos de teatro, cabarés, casas de jazz e blues e rodas de samba. No final de 2018, lançou a gravadora Trava Bizness, a primeira gravadora da história focada em artistas trans, onde produziu artistas como PamkaPauli, Alice Guél, Verônica Valentino, Veni, Marina Matheus, Natt Maat, Albert Magno.

Conheça agora um pouco mais da trajetória de sucesso de Malka:

Com mais de 20 anos de carreira, tem muita história para contar, mas conta como foi o início da sua trajetória, como tudo começou.

Venho de uma família com músicos. Meu bisavô, Horário, foi o primeiro que tenho conhecimento: um caboclo que tocava sanfona depois do trabalho e nos casamentos da região de Santa Rosa do Viterbo. Meu pai depois tomou o caminho tocando trompete como profissão até seus 26 anos. Com isso, a influência da música na minha família foi muito grande e comecei a tocar desde cedo, pois em casa quando era nova, mesmo morando a família toda em um quarto só, neste mesmo quarto tínhamos um órgão Spark da época de bandas do meu pai. Comecei a tentar tocar esse órgão desde cedo. Minha mãe disse que quando cheguei do hospital, a primeira coisa que fiz foi esticar o braço para alcançar as teclas e que eu sempre chorava para ela me deixar ficar a frente dos teclados. 

Ingressei em aula de teclado aos sete anos e meus pais na época fizeram um esforço tremendo para poder pagar e fiz aulas durante um ano e meio, que foi possível na época. Lembro que aos 7 anos de idade me apresentei no teatro municipal de São Caetano do Sul em um recital, tocando o tema de jazz “In The Mood” e desde então soube que aqui seria minha salvação ou perdição.

Malka – Foto de divulgação.

Falando sobre a primeira gravadora voltada para artistas trans no Brasil, o nome por trás da Trava Bizness é Malka Julieta. Conte-nos como foi a criação dessa gravadora e fale um pouco dessa história e da importância que ela representa. 

A gravadora foi um marco importante para a época que existiu, mesmo que curta, e creio que permitiu uma possibilidade de existência musical fora dos padrões da cisgeneridade. Depois dela, abriram duas gravadoras voltadas a pessoas trans aqui e entendo que esse é o mais importante legado: abrir novas perspectivas de existência. Foi um momento muito rico de trocas muito intensas e experiências transformadoras. Ela foi criada pois precisava ser criada, quase como um movimento natural. 

“Eu acredito que tudo é política, porque mesmo o estado de passividade é uma escolha política.” – Malka.

Você também levanta várias questões na sua música. Conte-nos sobre a importância de levantar a discussão sobre transfobia, racismo e exclusão social.

Eu acredito que tudo é política, porque mesmo o estado de passividade é uma escolha política. A arte reflete o momento em que vivemos. Hoje eu tenho voltado minha criação para uma arte menos politizada, digamos assim, creio que os artistas que eu produzo tenham mais contato direto com esse tipo de discussão de forma direta. É sempre importante entender que o corpo trans é, por si só, um corpo político e não necessariamente essas questões precisam ser levantadas nas músicas, mas penso que cada artista toma seu rumo como bem entender e com liberdade do que bem entender. Meu ponto é: não é por ser travesti que eu tenha obrigação de fazer uma arte politizada, a arte deve ser espontânea ao meu ver e abordar questões que eu precise abordar para mim mesma e depois para a sociedade. Eu me encontro em um momento diferente agora, pensando mais numa música que seja universalizada e que as minhas vivências também sejam naturalizadas. Muitas vezes o que é visto como político por uns é somente um estado natural dos nossos seres em estado de sobrevivência. 

Malka (a esquerda) durante a gravação do clipe Pimenta. Foto de divulgação.

E sobre projetos de estúdio, o que você tem trabalhado? Como é o processo criativo?

Tem muita coisa acontecendo nos últimos tempos. Tenho trabalhado muito com uma artista originária mexicana chamada Mare Advertência, minha conexão no México estabelecida em 2020 deu muito frutos bons para esse ano. Lá eu conheci e tive oportunidade de produzir Ah Mer Ah Su, uma cantora de Los Angeles Califórnia que esteve aqui no Brasil em janeiro para produzirmos seu novo álbum que será lançado no fim deste ano. Tivemos muitas participações especiais de pessoas muito poderosas no mundo da música, sejam do Brasil ou dos Estados Unidos, estou doida para poder compartilhar com vocês, mas como se trata de um projeto grande e precisa ser feito com calma, nossa idéia é lançar ele de outubro para frente, talvez até em 2022, o que me agrada muito, já que nessa fase da minha carreira estou tendo oportunidade de trabalhar com tempo para chegar na qualidade desejada. 

Tenho me cansado muito de trabalhar em produções fast-food, e fazer as coisas com carinho e paciência tem me mostrado como podemos chegar numa qualidade muito maior de resultado. Vim para Natal depois dessa produção a convite da minha amiga Luísa Nascim, da Luísa e os Alquimistas, e aqui estou, produzindo com artistas que amo, como ela, Potyguara Bardo, Dandarona Luz, Liza Waves, entre outras pessoas. Pretendo ainda no período que vou passar aqui até maio, fazer uma ponte para Pernambuco e Paraíba, que é logo aqui do lado para dar continuidade ao projeto de EP que venho tocando ao lado de Pri Zeferino e com participações de Jéssica Caetano e Afroito. 

Foto de divulgação.

Pretendo ainda me conectar com outros artistas da região como o Pedro Regada dos Alquimistas, com Luana Flores que temos namorado de aprontar juntas e por PE com Libra e outros artistas que tenho contato na região. Vim para cá para aprofundar a relação com os artistas nordestinos que tenho tanto carinho e contato desde sempre e entender melhor e de perto tudo que permeia suas musicalidades e vontades de vida. Aprontei um EP novo por aqui em Natal com muitas participações babadeiras e venho trazer um lado meu bem diferente com músicas pra cima e numa pegada mais pop, sempre misturadas ao meu som típico eletrônico de pista, mas com um toque mais brasileiro desta vez. Logo lançaremos esse EP por volta de junho, com vídeos e um grande apoio que vem por trás para ajudar bastante nossa caminhada. Uma das músicas do EP será lançada em coletânea em vinil promocional pela Colcci, ao lado de nomes fortes da cena eletrônica, como Gezender, Due, e nesse mesmo disco marca a estréia de uma música cantada pela Bruna Marquezini, que também estará no disco da marca.

Tenho trabalhado em muito conteúdo de audiovisual e teatro, que também saem ainda esse semestre e por último mais pro fim do ano pretendo lançar meu álbum pela Mamba Rec, gravadora da festa Mamba Negra da qual sou residente. Esse álbum está pronto desde o ano passado esperando a pandemia acabar para seu lançamento. Estou muito ansiosa e feliz por mesmo com tudo que está acontecendo conseguir me movimentar e crescer tanto, e com muitas expectativas em torno desses lançamentos.

Foto de divulgação.

Para encerrar, conte nos algo, um momento importante de sua carreira que gostaria de compartilhar

Eu acho que um dos pontos de virada da minha carreira foi a conexão com a BadSista em 2018, quando nos conhecemos nos grudamos e até hoje temos feito projetos juntas, como alguns trabalhos de mix, produções em parceria, seja de músicas nossas como com a Jasmine INfinite de NY, ou minha ajuda no arranjo de “Quem Soul Eu?” da Linn da Quebrada, ou o próximo single da Mare Advertência que produzimos juntas. Ela me potencializa muito e sempre é muito sincera sobre a qualidade do meu trabalho e isso é muito valioso pra mim. Através dela eu conheci a Mariana Boaventura, da Pantera Cartel, que me apoia muito no crescimento da minha carreira e foi a pessoa que soube pela primeira vez na vida entender como vender meu trabalho e me ajudar a prosperar. Amo muito essas duas mulheres na minha vida e são pontos importantíssimos de virada na minha história.

Malka Julieta

Produtora Musical

malka.ramirez@gmail.com

insta: @malkajulieta.b

facebook: http://www.facebook.com/malka.travabizness 

Link do Vídeo do clipe da Malka :

https://m.youtube.com/watch?v=l-yUIbaXpVo&t=51s

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