COLUNA | O tabu nas terminologias sexuais

É triste estar em 2021 e ainda ter que explicar certas questões básicas. Na verdade essas terminologias normal e socialmente usadas têm um efeito “encaixotante”: pessoas são reduzidas quando referenciadas por outras por essas “caixas”.

“Aquele viado ali”, “A travesty da esquina que faz programa à noite”, “Aquela mulher macho, deve ser caminhoneira”, “O hermafrodita, sabe?”

Frases que quando lidas sem ou com contexto ofendem. Não apenas por conta do tom que normalmente são entoadas, mas por conta da diminuição de valor que são atribuídas às existências referenciadas com ou sem contexto que “aprovem” tal diminuição. (Não existe motivo polido/aceitável/legal que efetive menosprezo).

E normalmente nessas terminologias comuns socialmente há mistura também de outros encaixotamentos (risos): orientação sexual, identidade de gênero, papel de gênero, biologia transgênera ou cisgênera. Quatro (5) grandes grupos que também estão intrínsecos no clamar de tais termos.

O termo “viado” por exemplo, se refere a uma orientação sexual (homosexual) especificamente do gênero masculino (ou seja, mistura identidade de gênero também) e, ao mesmo tempo, um papel de gênero (o papel de gênero feminino).

O termo “homosexual” se refere à mesma orientação sexual acima supracitada, contudo, no entendimento popular o papel de gênero é masculino:

“Ele não é viado/gay/bixinha, ele é um homosexual!”

O termo “travesty”, além de ser normalmente mal concordado com pronomes masculinos quando a cisgeneridade o usa, mistura a identidade de gênero (identidade feminina ou afeminada) com um papel de gênero (papel de gênero afeminado ou masculinizado), ou seja, não existe a mistura com a orientação sexual, nesse caso. 

“O travesty saindo com meu vizinho, olhe só”

“AQUELE TRAVESTY BEIJANDO MINHA EX???? ERA UM HOMEM DISFARÇADO, SÓ PODE!”

O assunto de transfobia estrutural que envolve a mal utilização pronominal nem precisa ser digerido nesse texto, mas sim, a mistura dos prévios encaixotamentos de papel e identidade de gênero. Então, não se espera que uma travesty se atraia por uma outra existência feminina, uma vez que na confusão da cisgeneridade, identidade de gênero não se desvincula da orientação sexual.

A necessidade de educação sexual é essa: o fim da ignorância social comum. (Ignorância é um substantivo que cria/foi criado a partir do verbo ignorar. Quaisquer outros sentidos desse substantivo que socialmente são veiculados a tal não são considerados nessa frase).

Também, o termo “hermafrodita” é interfóbico, por exemplo, o termo correto é “intersexo”. Uma pessoa que geneticamente foge do padrão cromossômico masculino e feminino e que são tidas como doentes/mal formuladas geneticamente por conta de seu nascimento, apenas. Até poucas décadas atrás e creio que ainda hoje ocorra: médicos amputam/amputavam a genital de tais bebês intersexos para que se assemelhasse ou à genital feminina ou à genital masculina já no nascimento.

De tão invisibilizado e pouco falado é esse assunto que a massa nem sabe como misturar os encaixotamentos para “definir” o que é uma pessoa intersexo. Ou simplesmente pode ser que a denominem travesty erroneamente. Uma vez que biologicamente os hormônios são produzidos de formas diferentes do que um corpo “feminino/masculino” ou simplesmente não são produzidos e tais corpos precisem também de terapia hormonal para funcionar com saúde.

“A pessoa intersexo é bonita”

Esse é um exemplo (utópico), mas que não seria (tão) ofensivo do que chamar de hermafrodita. O hermafroditismo é um evento comum em espécies animais e a “humanização e humanidade” corrompem o mesmo na espécie homo sapiens.

Por fim, tais misturas de encaixotamentos dificultam o entendimento da massa para entender as diferenças. Existências que fogem do padrão um pouco são mal interpretadas ou mal apontadas. Por conta de referências isoladas e pessoais (uma ex interesseira, por exemplo), por conta de desinformação da própria terminologia ou por falta de contato e interação com existências dissidentes. Não me encaixote!

                                          Texto por Kukua Dada

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