COLUNA | O importante equilíbrio entre a boa música e o material de divulgação

Sempre fui fisgado por ensaios fotográficos envolvendo DJs, aquilo me convida a conhecer o trabalho do artista através de uma curiosidade que é gerada ali no contato com a arte visual. Conversando com pessoas desse universo, fui tomando conhecimento a respeito de divergências sobre o assunto, alguns DJs não compram a ideia do Press Kit, pois acreditam que isso possa desviar o foco do principal, a música! Eu tenho uma opinião diferente, acredito que um ensaio fotográfico é uma ferramenta que ajuda na divulgação do trabalho do artista.

Lembrando que minha vivência no mundo da E-music é toda voltada para a cena underground, onde os DJs têm a arte como foco. Certamente o Business também está presente, mas a arte é o principal, então tudo que vou falar aqui se aplica nesse universo.

O Press Kit é uma peça dentro de um pacote. Um bom ensaio fotográfico, ao meu ver, funciona como uma espécie de convite para conhecer o que aquele artista tem para mostrar. O ensaio pode ser criado de uma maneira que expresse o conceito do trabalho do DJ, o que é muito legal, duas formas de arte atuando juntas!

Como falei acima, alguns DJs não gostam da ideia. Tem uma galera que acredita que o Press Kit é uma maneira “superficial” de se promover, tirando o foco daquilo que mais importa que é a música, a arte, o talento. Eu super entendo quem pensa dessa maneira! Como disse um amigo meu, “Arte pela arte’’. Mas e se o tal ensaio fotográfico entra como um complemento, “Uma peça dentro de um pacote” que está ali para agregar, proporcionando oportunidades de instigar o público a conhecer o trabalho do artista?

Nós que atuamos em veículos de mídia trabalhamos usando a arte visual para poder mostrar a cara daquele DJ, o que na minha ótica “humaniza” aquele “ser” que está por trás da música. Eu sinto vontade de saber mais sobre a pessoa que me proporcionou bons momentos através de sua arte, e também fico curioso para ouvir o trabalho daquele artista que vi em uma revista.

Para elaborar essa pauta de maneira mais ampla, conversei com 2 artistas visuais, o curitibano Eudig e o paulistano Roberto Justiça.

Eudig faz um trabalho bem interessante fotografando artistas do mundo da música, ele também integra o Coletivo 4×4 em sua cidade.

Segundo o Eudig:

“A parte fotográfica do ‘Press kit’ tem um papel interessante na relação do artista com a sua arte. A fotografia produz uma extensão da expressão artística que é criada pelo artista e apresentada pelo fotógrafo. Quando produzido com atenção, o ‘Press kit’ serve como uma ferramenta muito importante para o artista divulgar sua imagem de uma forma que relacione a sua estética sonora com a sua estética visual.”

Nati M. Foto: Eudig.

“Eu busco sempre conversar com o artista, tento entender um pouco sobre o conceito estético que busca mostrar para o público, começo entendendo qual é o ambiente que vamos fotografar, as luzes, o styling, mas sempre faço uma pesquisa particular para conhecer um pouco mais sobre o trabalho do artista, ouvindo suas tracks, ouvindo seus sets. Eu entrelaço todos aqueles sentimentos que retive pela música que escutei, o conceito estético que buscamos e adequo com o que é esperado pelo artista fotografado. Por fim, o produto final é o resultado de uma colab magnífica entre expressões artísticas que se complementam em suas frentes.”

sixx66. Foto: Eudig.

Enxergo nas palavras do Eudig todo um engajamento artístico do fotógrafo, voltando sua atenção para o trabalho do DJ e transpassando isso para a fotografia.

Roberto Justiça atua no ramo de fotografia há mais de 8 anos, já cobriu coletivas de imprensa para a revista Globo, SPFW, feiras de negócios e campanhas publicitárias para grandes marcas.

Segundo ele:

“Vejo no mundo de festas eletrônicas um nicho promissor, mas com uma grande resistência dos produtores de festas e DJs em investir em material de qualidade.”

“Press kit vai muito além de fotos bonitas para divulgação da imagem do DJ ou qualquer outro artista. Uma logomarca impactante, fotografias atuais e bem elaboradas já num formato para a produção de flyers, uma rede social bem cuidada com um público volumoso e que interaja, ter uma bio, alguns vídeos teaser do artista, ter um soundcloud ou outra plataforma com sets sempre atualizados ajudam muito o DJ na negociação para fechar um job. Infelizmente vejo muitos DJs bons focando no desenvolvimento de suas técnicas, enriquecer seu repertório e acabam esquecendo de se promover – algo que é muito importante na visão do produtor de eventos, onde ele quer lotar sua festa e entre contratar um DJ mediano com um grande público ou um muito bom mas desconhecido vai pesar muito na decisão de qual chamar. Muitas vezes investir em um material de qualidade com um bom profissional com retratos, vídeos teaser e cobertura da festa que pode ir de R$600 a R$2.000 vale muito a pena a longo prazo, pois esse material traz mais público e deixa em evidência o DJ na cena, trazendo muito mais profissionalismo ao DJ.”

Ensaio da DJ Katty Dalle. Foto: Roberto Justiça.

“Também ouço de alguns DJs que eles não querem ser muito comerciais, ao mesmo tempo reclamam que não são chamados para tocar em festas com um público maior, algo que para mim é incoerente, tudo bem se ele ou ela apenas enxerga ser DJ como hobby e toca por diversão, mas se a pessoa encara isso como um objetivo e quer viver da música, com certeza deve levar isso a sério e se inspirar nos maiores DJs da cena, já que, se para eles deu certo por que não daria para os que estão começando?”

Ensaio da Katty Dalle. Foto: Roberto Justiça.

“Ter um bom Press Kit e trabalhar com o crescimento de um público é algo exponencial – nos primeiros dois, três anos vai ser mais trabalhoso, mas à medida que esse público cresce o volume de seguidores cresce ainda mais. 

Basicamente flui entre a função do Press Kit e seus benefícios para a carreira do DJ.”

O Roberto traz uma visão bem comercial da coisa, todo um foco no marketing do artista.

No último depoimento eu quis trazer a visão de um produtor de eventos, convidei o Marcelo Madueño, também conhecido como “Madu”, um dos nomes por trás da Tantsa, uma das maiores festas da cena underground paulistana. Madu também atua em outros eventos como o festival alemão Time Warp.

Perguntei a ele a importância de um Press Kit na hora de bookar um artista para se apresentar em sua festa.

“Existem algumas coisas que são essenciais para um contratante executar bem o seu trabalho com o artista. Uma delas é o Press Kit, outras duas são o rider técnico e o rider de hospitalidade. O Press Kit é importante para que uma promoção do evento seja feita adequadamente. Nele contém tanto fotos como conteúdos legítimos e confiáveis de informação a respeito do artista. As peças de design que levam a foto do artista precisam ser aprovadas com o seu manager/booker, então essa padronização facilita o trabalho das duas partes e valoriza a imagem do artista. Já as informações são essenciais para que o artista seja devidamente apresentado ao público. O contratante sempre espera vender mais ingressos com o anúncio de um artista no line-up, então quanto mais forte esse conteúdo, mais ingressos ele venderá, o que poderá colocar o artista em uma melhor posição de carreira em suas gigs futuras.”

Em seguida perguntei se ele considera importante que os artistas tenham redes sociais.

“Antes das redes sociais, o poder estava centralizado em instituições que detinham acesso e controle dos canais de comunicação, como as gravadoras. Os artistas foram reféns dessa situação por muito tempo, sendo submetidos a relações abusivas com suas gravadoras. As redes sociais deslocaram esse poder para as mãos dos artistas, gerando maior independência para suas carreiras e uma conexão direta entre eles e sua base de fãs. Quando o artista escolhe não estar nas redes sociais, ele limita bastante o alcance e engajamento do seu conteúdo criativo, e também a visibilidade para ser descoberto por novos fãs.”

Muito interessante essa visão dele sobre artistas e redes sociais! Super concordo com o que foi dito, a possibilidade de o artista ter essa conexão direta com seu público é maravilhosa.

Para concluir, eu tenho uma ideia a respeito que diz: 

“É importante o DJ saber o que ele quer para o projeto dele, ele pode querer tocar para poucas pessoas e fazer um trabalho incrível, ele pode almejar tocar em clubs e festas renomadas, onde dependerá dessa ferramenta de marketing para incrementar o pacote, enfim…. Ao ter essa visão, ele vai conduzindo sua carreira utilizando aquilo que é necessário para alcançar suas metas. Mas ele não pode deixar em segundo plano o principal elemento, a sua música!”

Foto de capa: Ensaio da Katty Dalle. Foto: Roberto Justiça.

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