COLUNA | Fetichização travesty em escala nacional

Olhe, sendo bem honesta. Esses termos que envolvem tabus: sexo, fetiche, casamento entre outros, eu sempre relacionava intrinsecamente um ideal de putaria, promiscuidade no entendimento de cada um deles. Assuntos escorpianos que são comumente mal interpretados em sua totalidade.

O arquétipo escorpiano reflete sobre assuntos da hipoderme (camada mais profunda da pele), ou da rocha matriz (camada mais profunda do solo), e eles normalmente não são bem falados. Crendices, achismos, condenações são normalmente vinculadas a assuntos profundos.

E todo esse papo para dizer que: toda existência travesty (e quando eu digo travesty, NÃO me refiro às mulheres trans, transfeminilidade) é profunda, intensa, sofrida emocional ou fisicamente. Toda travesty sofre antes de ficar bonita e plena, ponto. Mas por quê isso?

Por quê toda travesty tem que sofrer? Por que não apenas se identificar como travesty e virar uma borboleta, uma sereia? Porque toda lagarta entra num casulo antes de sair e quando se torna borboleta tem poucos dias de vida. Porque toda sereia é caçada ou é considerada existência mitológica (invisibilizada).

A mesma linha de pensamento funciona para travestys: quando viramos borboletas ou sereias somos invisibilizadas, cada vez mais alvejadas, requeridas, invejadas… Porque a liberdade existencial da travesty/sereia/borboleta não conforma/concorda com o Capitalismo Colonial herdado pela nossa colônia desgovernada.

O fetiche, então, não apenas ronda uma questão hipersexual de corpos de existências femininas que se assemelham a corpos biologicamente masculinos. Ele ronda a morte desses corpos também.

Pessoas cisgêneras que não têm acesso a pessoas trans em seu cotidiano, seja mulher trans, homens trans, pessoas não bináries ou até travestys normalmente só acessam por notícias de TV ou de Internet (quando o assunto bomba). Essas notícias comumente revelam que uma travesty/mulher trans foi assassinada de alguma forma bruta, intensa, desumanizada. E essas mesmas pessoas cisgêneras comentam no máximo um: “que pena”, “que deus O tenha”, “tão NOVO, né?”. Isso quando não agregam ao fato do assassinato comentários travestifóbicos ou transfóbicos estruturais: “quem mandou escolher essa vida”, “mas ELE trabalhava na rua, fazer o quê?”. Ou seja, a cisgeneridade se conforma com nossa morte. É apenas um fetiche de desconforto o processo de desencarne de uma travesty.*

*Pronomes masculinos foram designados às existências femininas supracitadas para evidenciar a transfobia estrutural comum de pessoas cisgêneras que não têm acesso a existências dissidentes em seu cotidiano.

É em escala nacional porque só falo do Brasil, não importa o estado, cidade, se é interior ou capital. O fetiche é estruturado e não é individualmente consciente, ele faz parte de um consciente coletivo transfóbico/travestifóbico.

Entendam: a cisgeneridade, no geral, não se representa na transgeneridade, o que torna processos empáticos mais difíceis e tortuosos. Então, uma pessoa cis que nunca conversou com uma travesty não vai sentir remorso, tristeza, irritação verdadeira quando saber que uma morreu, seja em sua cidade ou em outra longínqua. Além do fato do termo travesty ser abominável aos ouvidos cisgêneros até hoje, e estamos em 2021…

A ressignificação da minha existência AOS OLHOS CISGÊNEROS é urgente, além de emergente. A responsabilização das mortes travestys pela cisgeneridade também é urgente, além de insurgente e incabível ao olhos da mesma cisgeneridade.

Mesmo uma pessoa cis nunca tendo visto pessoalmente uma travesty, ela contém responsabilidade quando essa mesma travesty é assassinada por uma pessoa cisgênera como ela. A “ignorância” de não saber sobre travestys não é argumento para falta de responsabilidade, mas sim, desculpa para manutenção das mortes. Portanto, mesmo que “ignorante” da minha existência, você, cis que me lê, é conivente, sim, pela minha morte quando você não age em minha vida, quando você não soma no meu corre, ou, no mínimo do mínimo, não me pergunta como estou. 

Se tal conivência fosse legislada, raros cisgêneros não seriam culpados e julgados por transfobia estrutural. Essa é uma realidade político social ATUAL: fechar os olhos, fingir que não tem a ver contigo é também um ato político contrário à VIDA de travestys (uma vez que a maioria das travestys nem vida tem, apenas SOBREVIDAS).

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