Todas as línguas que ainda são faladas no mundo são vivas, ou seja, estão em constante evolução de acordo como são usadas pelos seus falantes. Ainda que a forma considerada como norma demore a aceitar essas mudanças, não há como frear os novos usos que são estabelecidos pelos falantes de determinada língua. Com o português falado aqui no Brasil, não é diferente: tanto é que, apesar da herança portuguesa, nosso português, por receber contribuições de várias outras línguas, já se distanciou bastante desse parente europeu, a ponto de discutir-se algumas reformas ortográficas com o intuito de reaproximar os falantes da língua portuguesa pelo mundo.
Outro debate mais recente que tem acalorado as discussões entre linguistas não só de língua portuguesa, mas em todas as línguas, é a busca por uma neutralidade na língua quando nos referimos às pessoas não binárias, ou seja, que não se definem como masculino nem como feminino, além de uma proposta de reduzir o machismo expresso através das regras linguísticas.
Antes de analisarmos quais são as propostas de acréscimo, vale ressaltar que a nossa norma culta vigente atualmente permite diversos mecanismos para neutralizar a nossa língua sem precisar usar novas flexões de gênero, como por exemplo: ao invés de usar os termos “Os médicos/as médicas”, se trocar por “profissionais de medicina”, e assim por diante.
Entretanto, a linguagem neutra, também conhecida como não-binária, compreende o uso de uma terceira letra além do A e do O no final das palavras para evitar a binaridade dos gêneros masculino e feminino. A Linguagem Neutra tem o propósito de incluir todos os grupos na comunicação e apresenta propostas de alteração do idioma, como novas grafias, como por exemplo o uso da letra “e” no final dos pronomes e adjetivos como em “Bonito/Bonita” pode variar para “bonite”, ou a letra “u” em casos em que o “e” já demarca o gênero masculino, como por exemplo “ele/ela” pode variar para “elu”
Para uma parte mais conservadora dos professores e gramátiques da Língua Portuguesa, que discutem essa questão, defendem que a variedade masculina dos pronomes e dos artigos já abrange a neutralidade. Por exemplo, na frase: “amanhã eles vão à praia bem cedo”, o pronome “eles” pode referir-se tanto a duas pessoas do gênero masculino quanto a uma pessoa do gênero masculino e outra do feminino. Entretanto, a linguagem neutra propõe a extinção da predominância masculina na língua.
Os defensores do uso da Linguagem Neutra acreditam que essa forma de expressão contribui para acolher; respeitar e valorizar a diversidade; lutar contra a intolerância de gênero e o machismo; identificar e visibilizar todos os gêneros, inclusive os neutros, não privilegiar um determinado grupo em detrimento de outros e causar uma reflexão sobre desigualdade de gênero em outras áreas além da língua.
Outras mudanças de grafia que já foram propostas foi o uso do “x” ou “@”, mas essa opção dificulta a leitura por não produzir um som comum na língua portuguesa. Além disso, pessoas com deficiência visual que usam programas para ler textos seriam afetadas, pois os softwares não fazem a leitura de palavras escritas dessa forma.
Embora, hoje em dia, o masculino cumpra a função de plural na Língua Portuguesa, nem sempre foi assim, quando o Latim ainda era uma língua viva existia um pronome neutro além do feminino e do masculino. Isso mudou quando o latim virou o português arcaico decidindo-se pela abolição do neutro e adoção do masculino para o plural.
Esses especialistas afirmam não ser impossível que a Linguagem Neutra integre o idioma futuramente, porém ressaltam que depende diretamente da adesão pública. Portanto, sem o reconhecimento da sociedade, para eles, não existe possibilidade disso acontecer.
Por enquanto, a legislação determinou que concursos públicos e vestibulares, que exigem a utilização da norma culta da Língua Portuguesa, não permitam o uso da Linguagem Neutra. Entretanto, podemos repensar como usamos a nossa língua, prestando atenção em quais profissões utilizamos naturalmente a flexão do masculino, e, em quais a do feminino. Por exemplo, quando dizemos: “Advogados”, qual o perfil que se forma na nossa mente? E por que usamos mais “faxineiras, costureiras” no feminino do que no masculino para tentar neutralizar a nossa fala?