COLUNA | Remix: A reforma da casa – Parte 1

Da mesma forma que se contrata um arquiteto para reformar um quarto, uma casa, um edifício ou um bairro, encomenda-se a um produtor musical um remix (geralmente ele também é DJ). Assim, podemos fazer a mesma analogia quando um artista deseja gravar um cover de uma determinada música, conhecida ou não, despindo o original e produzindo um guarda roupa totalmente novo, mais hard ou mais soft, dependendo do partido que o “arquiteto” resolveu adotar, ou para qual tribo seria destinada a versão, ou simplesmente para qual canto de sua alma deseja preencher.

Na verdade, esse processo de “reformar” a casa sempre existiu na história da música, não importa em qual região do planeta; criar uma versão é printar em uma composição, a personalidade e a inspiração momentânea que o lóbulo criativo planejou em uma determinada sinapse casual.

Antes e depois do meu curso de arquitetura, sempre tive um fascínio latente em reformar; passava por uma casa ou um edifício qualquer, principalmente os abandonados, e pirava rapidamente em como aquilo poderia ser de uma outra forma, de um outro partido. Quando comecei minha empreitada na produção musical, percebi de imediato essa semelhança de idéias, reforma e remix, e foi muito fácil idealizar, organizar e executar os projetos. Ou seja, um artista planejou e executou uma música de uma forma X, que vibra tendenciosa para um estilo X1 e que atinge um público X2, mas que NÃO se propaga para os públicos Y2 e Y3; ele contrata um produtor musical determinado para ir direto a estes públicos ou, mudando a mão da rua: eu percebo que a canção “Your Song” do genial Elton John, de melodia triste e suave, ficaria perfeita com uma roupa uptempo, exorcizando a melancolia, fazendo todos pularem na pista de dança. A composição “Your Song”, como instituição musical, fundada por Elton John em 1970, troca de mãos simplesmente com uma mexida no guarda roupa (em 1972 com Billy Paul e em 1976 com Al Jarreau).

O que implica, em suma, quando você diz “eu adoro a música Your Song“? Na verdade, você está se referindo a qual versão? A pioneira dos autores britânicos, a versão “baladeira” (na época) do Billy Paul, ou a versão jazzy do Al Jarreau? Até que ponto você elege a música como composição ou como arranjo? Ou mais fundo, até que ponto um arranjo, uma repaginada ou um remix muda a vida de uma composição? A história está cheia de exemplos em que versões fizeram mais sucesso do que as originais (Nightcrawlers “Push The Feeling On”; Everything But The Girl – “Missing”, em se tratando de remixes). Mas existem as definitivas, derradeiras, registradas por dois artistas, por exemplo, que dividem o globo em dois hemisférios de preferências (Frank Sinatra / Elvis Presley“My Way”; Liza Minnelli / Frank Sinatra – “New York, New York”).

No passado, as preferências, as diferenças e as escolhas eram “regidas” pela condução das obras; o maestro ditava o andamento, que poderia claramente transformar sutilmente o painel cromático da peça, apesar da raiz ditada pelo compositor – allegro, andante etc (desde pequeno, ouvi centenas de interpretações do Concerto No 1 de Tchaikovsky, sendo a do Horowitz regido por Toscanini a que me apaixonei).

Concerto No. 1 de Tchaikovsky“, por Horowitz regido por Toscanini

Resumindo, até que ponto você reconhece REALMENTE o valor de uma composição na essência, na estrutura, já que ela pode ser vista infinitamente de vários ângulos. Até que ponto o arranjador e produtor são menos importantes do que o próprio autor da obra? Nesse papo introdutório, tento levantar esta bandeira em pró dos arranjadores e produtores, que até mesmo podem mudar uma composição, transformando-a em uma nova obra (seria essa a intenção).

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JALES

JALES Diretamente de Guaranésia, MINAS GERAIS, erradicado em terras cariocas. JALES codnome de Álvaro Antônio, artista de 28 anos. Pesquisador musical desde os 15 anos de idade, se debruça em