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ÍCONE | “A música me pegou”

Quando criancinha já pegava os discos pra tocar em sua casa, e acabou levando isso pra vida, pois a música o pegou de verdade. Conheçam a história do DJ Yonoid.

Jairo Silva, paulista, nascido nos anos 80, é o ícone do underground deste mês na Colors DJ Magazine. Ele que tem um dos acervos de vinil mais invejáveis da cena, colecionando os discos desde os anos 90, e que sempre traz grandes influências de Soul, Disco e Funk, mas com muita House de Chicago e o Techno de Detroit. 

Já rodou muitas noites importantíssimas da cena underground brasileira e teve reconhecimento internacional com seus sets divulgados pelo grupo Detroit Techno Militia (Detroit, MI) e pelo selo belga Motorcitysounds, participando também do festival virtual Charivari Detroit ao lado de grandes lendas como Juan Atkins, Terrence Parker, Delano Smith e Rick Wilhite.

Atualmente é residente e mentor do projeto Hi Tek Soul, que rola há 6 anos no centro de São Paulo, e contará um pouco sobre toda a sua trajetória nessa entrevista especial de Ícone do mês. Confira agora!

Fale um pouco sobre a sua infância e adolescência musical.

Desde os 4, 5 anos de idade eu tinha a mania de pegar os discos de vinil que tinham em casa, e botar numa pequena vitrola que havia ganhado do meu pai pra tocar. Pegava os discos de casa que meus pais ouviam mesmo, tipo Roberto Carlos, LPs com trilhas sonoras de novelas e afins. Mas lembro que uma coisa que marcou na minha vida foi quando um tio chegou com o disco “Thriller”, do Michael Jackson – lembro que achei a capa incrível, assim como as músicas. Depois liguei na TV e vi o clipe também, fiquei fascinado. Na minha adolescência, como vivia num bairro muito perigoso, acabava ficando muito tempo no quarto ouvindo programas de rádio, era início dos anos 90 – tocava muita dance music na rádio. Ouvi uma música chamada “THE MUSIC’S GOT ME” do BASS BUMPERS e aquilo revirou minha cabeça – na mesma época descobri os programas Lunch Break, onde tocavam DJs de várias casas noturnas de SP, o programa Garage 70 do Ricardo Guedes e o programa da Sound Factory, na Metrô FM. Isso tudo fez com que eu começasse a comprar discos de vinil ainda moleque e na escola quando tinha som, eu era sempre o cara que levava discos ou fitas – já era o DJ sem ter muita ou nenhuma ideia do que aquilo realmente era.

Suas referências antes de se tornar DJ profissional, quais eram?

Primeiro deve ter sido o Ricardo Guedes (ouvindo pela rádio), depois comecei a sair para clubes ainda moleque, especialmente a Sound Factory Penha – quando fui naquele lugar minha vida mudou. Então os DJs da Sound Factory, Julião, GU, Ilya Simone, GKD, Marky, acho que foram minhas primeiras referências.

Como foi o início de sua carreira?

Eu já comprava discos desde moleque, e na época era moda entre a molecada na zona leste criar equipes de som. Então um amigo meu sabia que eu tinha alguns discos e às vezes me chamava pra tocar umas 3 músicas – eu não tinha ideia de como mixava, só comecei a entender quando coloquei as caixas do meu lado enquanto treinava em casa, percebi que errava tudo aí e comecei a melhorar. Mais tarde começaram a rolar as festinhas em Garage, geral na quebrada frequentava a Sound Factory e Freedays, então todo mundo curtia mais ou menos o mesmo som. Era fácil reunir a galera, e com o tempo comprando discos na Galeria 24 de Maio, fiquei amigo do DJ Gu, que era DJ residente da Sound Factory Pinheiros. Esse aí me ensinou muita coisa no começo, inclusive me indicando para algumas festas.

Foto: Divulgação.

Quais pessoas te ajudaram no início de tudo?

Meu pai, que mesmo não achando o caminho ideal, sempre me deu uma força, mesmo sendo de família humilde, ele me deu os primeiros toca discos e nunca deixou de me incentivar. Meu irmão, que foi muito parceiro no meu início como DJ, a gente comprava até discos junto. Nagel Noronha, na época promoter da Loca, foi o primeiro a me dar oportunidade para tocar em um clube numa noite realmente importante na cena underground. DJ Gu, que além de mentor, me ajudou muito a arrumar as primeiras gigs – como ele na época trabalhava numa loja de discos chamada Techno Records na Galeria Ouro Fino (junto com o DJ Edinei da Loca), sempre me indicava para entrar no line up da casa onde tive a oportunidade de tocar várias vezes.

Como é pra você passar por diversas fases da cena eletrônica brasileira?

Um aprendizado. Vi muita mudança, gerações diferentes, época do reinado dos clubes, depois o domínio das festas independentes e pequenas, festas underground pela cidade.

Qual a sua visão do underground de hoje em dia?

A cena underground cresceu bastante, você vê artistas de todos os tipos, desde performers a artistas visuais, DJs etc. Acho que falta um pouco mais de abertura além da bolha, especialmente para artistas da periferia, tem muita gente da quebrada escondida por aí querendo mostrar seu trabalho – foi uma das coisas que me motivou a começar a fazer festas.

Fale um pouco sobre o reconhecimento que você teve fora do país.

Isso é a magia da música! Às vezes você não tem idéia de onde pode chegar – eu já tive set divulgado pelo pessoal do Detroit Techno Militia, que uma vez entrou no meu Soundcloud e pediu pra divulgar. O mesmo ocorreu com o Label MotorcitySounds, da Bélgica, do meu amigo Klaina (MELODYMATHICS). Tem os amigos do Vocoder, um label da cidade do México que tem fortes laços com Detroit, inclusive fizemos alguns eventos virtuais juntos nessa pandemia. Fui convidado também para tocar no Festival Virtual Charivari Detroit, e recentemente para um evento virtual da Tec-Troit também de Detroit. Eu acho incrível que meu amor pela música tenha atravessado fronteiras.

Quais pessoas você percebe que fez a diferença te apoiando durante todos esses anos de carreira?

Meus pais e meu irmão sempre, todo o pessoal que sempre me ajudou muito nas festas Hi Tek Soul, que eu faço há mais de 6 anos (obviamente passando por um break por conta da pandemia), vários artistas diversos, amigos, DJs que sempre deram suporte à festa – se for citar nomes vai ficar uma lista extensa e sempre vai faltar alguém.

[Yonoid em sua festa Hi Tek Soul, quando rolava no Trackers no centro de SP.]

Como foi participar do festival virtual Charivari Detroit?

Uma surpresa! Vi na caixa de Spam uma mensagem de Todd C Johnson me convidando pra fazer parte de um festival virtual. Me perguntei como meu som chegou nele, fiquei bem feliz! O festival teve uma audiência absurda, foi gratificante ver tanta gente acompanhando e gostando do meu som, especialmente da cidade que é a minha maior referência musical.

Quais as suas influências atualmente?

Gosto de ouvir de tudo, desde rock, hip hop, funk, soul, jazz, trilha sonora de games e até música clássica.

Como você enxerga esse período turbulento em que estamos passando por conta da pandemia?

Insano e triste, vi notícias de muitas pessoas que perderam a vida e perdi também amigos nesta pandemia. Infelizmente no Brasil temos um governo que está jogando contra, mas mesmo com tudo isso, espero que logo todos sejam vacinados e as coisas melhorem.

Foto: Divulgação.

O que tem feito para o grande retorno no pós pandemia?

Musicalmente tenho pesquisado mais do que nunca, além de estar mexendo com produções, acabei tendo mais tempo pra isso. Espero que logo possamos encontrar todos os amigos com saúde numa pista de dança.

De toda a sua vivência em muitos clubs brasileiros, quais você tem lembranças que gostaria de dividir com a gente?

As primeiras gigs com pista cheia, que foram na Loca – começo dos anos 2000, onde os meus dedos ficavam suados, e quando a pista reagia eu abaixava a cabeça pq era muito tímido na época. Ter tocado algumas vezes no Lov.e, que foi um dos clubes mais importantes na fomentação da cena paulistana. As primeiras gigs fora da cidade, que pra mim era como um sonho. Lembro da primeira gig que toquei fora de São Paulo, no Rio de Janeiro – eu era totalmente inocente e amador, os caras me convidaram, não falei sobre cachê, fui de busão, a festa lotou, tinha mais de 1000 pessoas e saí sem nenhum real no bolso (mas ficou o aprendizado rs). As gigs em Porto Alegre, que sempre foram incríveis. O Trackers, que foi o clube que me abriu as portas e fiz a minha festa Hi Tek Soul por anos, onde fiz muitos amigos, aprendi muito e dividi a cabine com DJs incríveis. O Bar do Netão (na Rua Augusta), onde estava fazendo as festas antes da pandemia e lá sempre superou as expectativas.

[Yonoid tocando na festa Hi Tek Soul, no Bar do Netão, numa das últimas antes da pandemia.]

Por fim, qual o episódio que mais te marcou durante todos esses anos?

Uma vez que toquei no Lov.e, meados dos anos 2000, era a casa do momento – Mau Mau era residente da noite chamada Technova (que rolava às sextas feiras) e eu ia abrir a noite, Mau Mau tocaria em seguida. Ele atrasou um pouco e acabei fazendo um set de 3 horas, com a pista cheia. Mau Mau foi uma das referências quando comecei e foi a primeira vez que dividi a cabine com ele, estava emocionado. Lembro que quando o homem chegou e passou por trás da cabine com os discos pra tocar pensei “Caramba é o Mau Mau” – minhas pernas começaram a ficar bambas, hoje lembro e acho engraçado.

Confira agora a playlist especial que criamos com as músicas que o DJ Yonoid mais escutou nos últimos meses:

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